Favorito da “Faria Lima” para disputar o Palácio do Planalto, o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, conseguiu nesta sexta-feira trafegar no “gelo fino” em que opera para tentar se viabilizar como candidato à sucessão presidencial no ano que vem.
Após um período de silêncio nas redes sociais, ele voltou a se manifestar mostrando-se totalmente solidário ao seu padrinho político, Jair Bolsonaro, e desviando dos conselhos de parte de seus apoiadores e de integrantes do centrão, que queriam vê-lo mantendo distância da crise que está escalando.
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Demonstrando lealdade…
Nos principais trechos de sua mensagem nas redes sociais, Tarcísio evocou um assunto caro ao bolsonarismo: as “eleições livres, justas e competitivas”. “Não haverá pacificação enquanto não encontrarmos o caminho do equilíbrio. Não haverá paz social sem paz política, sem visão de longo prazo, sem eleições livres,
justas e competitivas. A sucessão de erros que estamos vendo acontecer afasta o Brasil do seu caminho”, afirmou.
A lógica de demonstrar lealdade a Bolsonaro evidencia o apetite eleitoral do governador. Ele sabe que, sem o apoio de seu padrinho, uma candidatura ao Planalto é pouco viável. Também demonstra a percepção de que, se atrair a inimizade do ex-presidente e ficar com pecha de traidor, até mesmo a reeleição
em São Paulo, hoje considerada certa, ficaria em risco.
Sem radicalizar
Mas, em um gesto também ao establishment político, Tarcísio não fez ataques diretos ao Supremo Tribunal Federal, embora tenha timidamente dado um recado para a Corte ao falar de “sucessão de erros”. A falta de um embate mais aberto tem custado a antipatia de parte da direita radical, mas isso é algo que pode ser
neutralizado caso Tarcísio seja bem-sucedido em manter a amizade de Bolsonaro.
A decisão do ministro Alexandre de Moraes, do STF, de aplicar medidas cautelares contra o ex-presidente teve forte repercussão nos bastidores da política de São Paulo. Até oposição reconhece respiro de Tarcísio Imprensado entre o bolsonarismo e a obrigação de atuar pelos interesses do estado que governa, visto que a economia de São Paulo será uma das mais atingidas pelo tarifaço anunciado por Donald Trump, o governador terminou a semana aproveitando a
chance para defender Bolsonaro sem precisar entrar no mérito das medidas tomadas pelo presidente americano.
Até na oposição a Tarcísio a decisão do ministro foi interpretada como um “refresco” para o governador, que ganhou a oportunidade de se reposicionar com o chamado bolsonarismo após ter sido alvo de duras críticas de Eduardo Bolsonaro (PL), filho do ex-presidente, por ter buscado uma solução diplomática para o tarifaço imposto ao Brasil por Donald Trump.
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Bolsonaro mantém estratégia
Apesar do reposicionamento e da tentativa de distensionar com o padrinho, Tarcísio segue na incerteza, que foi reforçada pelas declarações de Bolsonaro após ter sido obrigado a colocar a tornozeleira eletrônica.
O ex-presidente reforçou a estratégia e a intenção de carregar sua candidatura até o fim, elemento que dificulta muito o caminho para Tarcísio se viabilizar como o candidato da direita ao Planalto.
Bolsonaro não deu nenhuma brecha nas entrevistas que concedeu e que, aparentemente, será seu novo foco de comunicação já que está proibido de usar as redes sociais. E salientou que considera que seu nome é o único capaz de vencer o presidente Lula, fala que essencialmente é corroborada pelas pesquisas e pelo agregador do JOTA.
Apesar disso, o Centrão ganhou mais um argumento no esforço de tentar convencer Bolsonaro a abençoar um nome alternativo e unificar a direita a tempo de consolidar uma candidatura.
Planalto vê riscos na decisão do STF para retomada da popularidade
Enquanto a direita curiosamente parece ter ganhado um presente político de Alexandre de Moraes, a percepção no Palácio do Planalto é de que o movimento do STF acabou sendo arriscado para o governo Lula. Isso pelo potencial tensionar ainda mais a animosidade da Casa Branca em relação ao Brasil.
Uma leitura no entorno do presidente é que ele, que já iniciava uma leve recuperação de popularidade, vive neste momento “uma tempestade perfeita”, com os ventos a favor de Lula. Mas essa tempestade pode se transformar em “furacão”, caso o tarifaço de Trump passe a afetar a economia. O temor é de que a crise que vem ajudando a impulsionar a aprovação do presidente possa se virar
contra ele.
O tarifaço de Trump deu de presente a Lula a bandeira do nacionalismo. E a informação de que o governo americano incluiu o PIX em uma investigação sobre as práticas comerciais brasileiras também ajudou o presidente a inverter a narrativa e a se colocar como defensor desse mecanismo de transação. O escândalo causado pela “fake news” do PIX está na origem do tombo da popularidade do petista, na virada do ano.
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Tensão subindo
A sensação no Planalto é que o ambiente está ficando cada vez mais tenso, com Moraes, o clã Bolsonaro e Trump esticando a corda e dobrando a aposta.
Lula conseguiu afinar o discurso nas redes e na noite de quinta-feira fez um pronunciamento em cadeia de rádio e TV propositalmente forte contra as tarifas. Após a notícia das medidas cautelares contra o ex-presidente nesta sexta, a ordem inicial no Palácio foi silenciar. Durante a manhã, nenhum ministro ou integrante do governo fez menção ao episódio.
Só à tarde, Gleisi Hoffmann (Relações Institucionais) entrou no tema em sua conta no X para justamente responder a Tarcísio que partiu em defesa de Bolsonaro. Claramente é uma reação de quem percebe que Tarcísio está tentando se posicionar e tem chances de se viabilizar como o concorrente de Lula em 2026. E a lógica é tentar jogar toda a rejeição de Bolsonaro no colo do governador paulista.
Sem interlocução com os EUA
Para além das questões da corrida ao Planalto, a leitura no entorno de Lula é que o próximo alvo de Trump pode ser Alexandre de Moraes. Fontes entendem que os movimentos do republicano, encerrando com a carta que enviou a Bolsonaro na noite de quinta, sinalizam que ele “matou o assunto no peito”, jogando para si a responsabilidade de lidar com o Brasil.
Assim, na visão de integrantes do governo, praticamente não há neste momento interlocutores com quem se possa conversar fora do Salão Oval da Casa Branca. O interlocutor, agora, é Trump. O problema é que não há diálogo entre os dois presidentes. Está fora de cogitação uma ida de Lula a Washington para negociar com o republicano. Teme-se expor o presidente brasileiro a uma humilhação semelhante à que foi submetido o ucraniano Volodymyr Zelensky em fevereiro. Também não há até agora a intenção de agendar um telefonema entre os mandatários. Mas Lula deve ir a Nova York em setembro para a Assembleia-Geral das Nações Unidas.
Apesar do medo de a “tempestade perfeita se transformar em um furacão”, a sensação no governo é que o impacto econômico das tarifas tende a ser limitado, dada a relativamente baixa exposição do Brasil aos Estados Unidos. Entretanto, algumas empresas, como a Embraer, e setores como o de suco de laranja e do café podem sofrer mais.