Distúrbios do sono afetam hormônios, ovulação e a qualidade do sêmen, sendo fatores que dificultam a gravidez. As evidências mostram: ao tratar distúrbios e adotar rotinas saudáveis, os resultados reprodutivos melhoram de fato Saúde, Brazil Health, Fertilidade, Sono CNN Brasil
Dormir mal vai além do cansaço: em mulheres, distúrbios do sono estão associados a menor fertilidade e a resultados menos favoráveis em tratamentos, como a fertilização in vitro (FIV), provavelmente devido ao impacto nos eixos hormonais, na inflamação e no estresse oxidativo. Uma revisão sistemática publicada em 2024 encontrou ligação consistente entre alterações no sono, infertilidade feminina e piores desfechos reprodutivos.
Nos homens, o padrão se repete. Meta-análises e estudos populacionais indicam que tanto a privação quanto o excesso de sono estão ligados à pior contagem, motilidade e morfologia dos espermatozoides — uma relação em formato de “U”, em que dormir cerca de 7 a 8 horas por noite é o ideal.
Sonolência, turnos e saúde hormonal
Trabalhos noturnos ou em turnos rotativos — que desajustam o relógio biológico — aumentam o risco de irregularidades menstruais, dismenorreia e até menopausa precoce, reforçando a conexão entre ritmo circadiano e saúde reprodutiva.
A melatonina, o hormônio do sono, também tem papel importante na fisiologia reprodutiva (ovulação, qualidade do oócito e ambiente folicular); quedas crônicas desse hormônio podem prejudicar esses processos.
Distúrbios específicos exigem atenção: na síndrome dos ovários policísticos (SOP), a apneia obstrutiva do sono (AOS) é mais prevalente e pode reduzir a resposta ovariana e os resultados da FIV. Diretrizes internacionais recomendam investigar sintomas de AOS em mulheres com SOP.
Hábitos de sono para casais que buscam engravidar
- Horário regular: deitar e levantar em horários semelhantes (inclusive nos fins de semana) favorece o ciclo hormonal reprodutivo.
- Luz adequada: exposição matinal à luz natural; à noite, reduza o uso de telas ou LEDs por pelo menos 60–90 minutos.
- Ambiente preparado: quarto escuro, silencioso e com temperatura entre 18–22 °C. Colchão e travesseiro confortáveis fazem diferença.
- Cafeína e álcool: limite a cafeína após o meio-dia e evite álcool próximo ao horário de dormir (ambos prejudicam o sono e a qualidade do sêmen).
- Atividade física (no horário certo): praticar exercícios regularmente melhora o sono e a sensibilidade à insulina; prefira treinos intensos até 3–4 horas antes de dormir.
- Rotina para relaxar: banho morno, leitura leve, respiração controlada (4-7-8) ou meditação auxiliam no início do sono.
Quando buscar tratamento antes da reprodução assistida
Procure avaliação médica antes de um ciclo de FIV ou após 6–12 meses de tentativas sem sucesso se você tiver:
- Insônia crônica (três ou mais vezes por semana, por pelo menos três meses), sonolência diurna importante ou muitos despertares durante a noite;
- Sinais de apneia: ronco alto, pausas respiratórias notadas, despertar sem sensação de descanso, cefaleia matinal — especialmente em pessoas com SOP, sobrepeso/obesidade ou pescoço largo;
- Trabalho noturno ou turnos rotativos com ciclos menstruais irregulares e sintomas de descompasso circadiano.
Tratar a insônia (de preferência com terapia cognitivo-comportamental, não com sedativos) e a apneia (CPAP, perda de peso, higiene do sono) melhora marcadores metabólicos e pode otimizar a resposta ovariana e seminal, além dos resultados da FIV. Para casais que trabalham por turnos, é recomendável estabelecer horários de sono estáveis e, se possível, diminuir o número de noites consecutivas de trabalho durante o período de tentativas.
Conclusão
Sono adequado é um dos pilares da saúde reprodutiva — tão relevante quanto alimentação, exercício e controle do estresse. Ajustar hábitos e tratar distúrbios do sono pode aumentar as chances de uma gravidez espontânea e melhorar a eficácia dos tratamentos reprodutivos. Se o relógio biológico está desregulado, alinhar o sono pode ser o passo que faltava para conquistar o sonho de ter um bebê.
*Texto escrito pelo ginecologista Paulo Gallo de Sá (CRM 422765 / RJ – RQE 26621), especialista em Reprodução Humana e Membro da Brazil Health