No final de 2024, foi instituído o Sistema Brasileiro de Comércio de Emissões (SBCE), descrito pela Lei 15.042/2024 como um ambiente regulado destinado à comercialização de ativos representativos de emissão, redução de emissão ou remoção de GEE no País. Isto é, criou-se um mercado regulado doméstico que se somará ao existente mercado voluntário de carbono. Para investidores, esse avanço legislativo representa uma oportunidade estratégica, mas também traz questões relevantes sobre a possibilidade de comercialização internacional dos créditos gerados especialmente em projetos de Soluções Baseadas na Natureza (NBS).
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Estima-se que o Brasil possua o maior potencial mundial para oferecer soluções de sequestro de carbono, com cerca de 15% das oportunidades globais. O país concentra um terço do potencial global de reflorestamento, um quarto da possibilidade mundial de conservação florestal e ocupa a primeira posição na adoção de práticas agrícolas sustentáveis[1]. Em razão disso, a Lei nº 15.042/2024 previu a possibilidade de se transacionar os créditos de carbono florestais gerados por projetos públicos ou privados de REDD+ ou ARR (Afforestation, Reforestation, and Revegetation), desde que submetidos a metodologias nacionais ou internacionais previamente aprovadas pelo órgão gestor do SBCE.
Previu-se, ainda, que o Registro Central do SBCE permitirá a interoperabilidade com outros sistemas internacionais de comércio de emissões. Um exemplo de interoperabilidade é o acordo entre a Suíça e a União Europeia, que permite o comércio de créditos entre os dois sistemas desde que haja registro em ambos, ou ainda o caso de Singapura, que autoriza o uso de créditos internacionais mediante validação do país anfitrião. Tais exemplos demonstram que a interoperabilidade entre sistemas é viável, ampliando a liquidez desses créditos e atraindo investimentos.
Da mesma forma, os créditos de carbono registrados no âmbito do SBCE também são elegíveis para transferência internacional entre países membro do Acordo de Paris como ITMOs (Internationally Transferred Mitigation Outcomes). Tal transferência será regulada em ato do Comitê Interministerial sobre Mudança do Clima e está sujeito à prévia autorização da autoridade a ser apontada pelo governo brasileiro.
Embora ainda precise de regulamentação, a previsão legal abre a possibilidade de que projetos de NBS no Brasil gerem créditos aptos não apenas a cumprir obrigações domésticas, mas também a serem transacionados em mercados internacionais. O país tem, assim, um desafio duplo pela frente: por um lado, construir um sistema doméstico sólido, capaz de garantir a integridade ambiental e a segurança jurídica dos créditos; por outro, assegurar que esse sistema dialogue com outros mercados, de modo a potencializar investimentos em soluções climáticas e contribuir para o cumprimento dos compromissos internacionais do país.
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A construção de um mercado de carbono brasileiro robusto e interoperável exigirá, portanto, regras transparentes, metodologias confiáveis e internacionalmente aceitas, além de clareza sobre a coexistência entre o regulado e o voluntário, evitando-se, assim, sobreposição e riscos de dupla contagem. O país tem potencial para se tornar protagonista global nesse campo, mas isso dependerá da capacidade de alinhar seus instrumentos de política pública às melhores práticas internacionais, sem perder de vista suas necessidades domésticas.

