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Acesso à justiça no Brasil e o triunfo dos litigantes habituais

Última atualização: 21 de maio de 2025 10:16
Published 21 de maio de 2025
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Tudo começou com a tese de que o “mero aborrecimento” não caracteriza dano moral. Depois veio a discussão sobre a necessidade de esgotamento da esfera administrativa como condicionante ao ajuizamento ou ao processamento de demandas.

E agora o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) recomenda aos juízes e tribunais que adotem medidas para identificar, tratar e prevenir a “litigância abusiva” (Recomendação 159 do CNJ), assim considerada, entre outras hipóteses,[1] a litigância frívola.

Alto lá.

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Numa bela manhã de segunda-feira, Jorge, em seu primeiro dia de férias, gira a chave do carro, que não funciona. Frustrado por não poder concretizar a tão sonhada viagem para Arraial do Cabo, Jorge leva o veículo, rebocado, a uma concessionária próxima de sua casa. O atendente da loja, um totem eletrônico muito gentil, emite uma ordem de serviço que Jorge deverá acompanhar pelo site da empresa.

Só que o site não contém um layout amigável, não possui informações claras etc. Depois de uma verdadeira via crucis, Jorge descobre um telefone SAC da empresa e, finalmente, obtém a informação de que o carro será entregue no final da tarde do dia seguinte.

Dona Marta não teve melhor sorte: animada com as economias feitas nos últimos meses, resolveu presentear sua neta, Maria Luísa, com a mais nova boneca do mercado. Dona Marta compra a boneca pela internet e deseja entregar o presente na festa de aniversário de Malu. Ela é diligente, efetua a compra com antecedência, mas o prazo contratado com a loja virtual não é respeitado, a boneca chega com um dia de atraso.

Jorge e Dona Marta resolvem processar a concessionária de veículos e a loja virtual, mas seus pedidos de indenização por danos morais são julgados improcedentes, pois o Juiz do Juizado Especial Cível considerou ter ocorrido “mero aborrecimento”.

Antes disso, o magistrado já havia condicionado o prosseguimento das demandas de Jorge e Dona Marta à formulação de reclamações formais no site Consumidor.Gov,[2] o que os autores fizeram, embora a contragosto (Jorge trabalha doze horas por dia, não tem tempo para nada; Dona Marta tem uma certa dificuldade com a internet).

Inconformados, Jorge e Dona Marta recorrem, mas a Turma Recursal dos Juizados Especiais Cíveis mantém as sentenças de improcedência, já agora sob o argumento de que as demandas de nossos personagens são “frívolas”. Em nossos exemplos, as teses do “mero aborrecimento” e da “abusividade por frivolidade”, combinadas com a exigência de prévio esgotamento das instâncias administrativas, formam um obstáculo praticamente intransponível de acesso à justiça.

Sabemos que o Judiciário brasileiro está assoberbado, tendo que dar conta de mais de 83 milhões de processos e sabemos que a movimentação da máquina judiciária é custosa e lenta.

Não obstante, é também sabido que o crescente movimento de acesso à justiça no Brasil, a partir da Carta Política de 1988, potencializou o gozo de direitos fundamentais e a proteção dos direitos dos consumidores, um direito igualmente fundamental (art. 5º, XXXII).

A propósito, cabe lembrar da singela advertência de Cappelletti e Garth: a titularidade de direitos é destituída de sentido na ausência de mecanismos para a sua efetiva reivindicação.[3] Lembremos ainda que o acesso à justiça é um um direito fundamental (art. 5º, XXXV, da CF) e humano,[4] e que por acesso à justiça se compreende a possibilidade de reivindicar direitos e resolver conflitos perante o Judiciário e a possibilidade de obter resultados efetivos.

Mas parece que o Judiciário brasileiro cansou do acesso à justiça, há um claro fastio nos gabinetes. Provavelmente porque as grandiloquentes promessas do NCPC de 2015 ainda não se concretizaram: os meios adequados de resolução de conflitos, a simplificação dos procedimentos, a tecnologia ainda não resultaram na diminuição do número de demandas. O que se vê é justamente o contrário.[5]

Não se pode duvidar de que foi o crescente movimento de acesso à justiça que possibilitou o incremento da legitimação social e política do Judiciário perante a sociedade e a opinião pública. Um Judiciário antes acanhado e encurralado, o menor dos poderes durante a ditadura civil-militar de 1964, ostenta agora o papel de resolutor universal de conflitos e de poder moderador da República, com todos os ônus e, principalmente, vantagens daí decorrentes (orçamentos robustos etc.). Seu ativismo é uma realidade, para o bem e para o mal.

Voltando à Recomendação CNJ 159 seria o caso de indagar quais seriam os critérios objetivos (valor da causa?) e subjetivos (recortes de classe, raça, gênero e sexualidade?) para considerar uma demanda sem importância, frívola.

Simplesmente não há e é exatamente esse o problema de considerar o acesso à justiça sem levar em conta as vulnerabilidades dos atores envolvidos, ou seja, sem indagar o significado de frivolidade para Otávio, um homem branco e rico da Zona Sul do Rio de Janeiro, e para Edith, uma empregada doméstica negra da periferia.

Seria igualmente o caso de indagar se não haveria – como de fato há – uma cultura de violação de direitos no Brasil, um quadro de ilicitude lucrativa[6] de que os litigantes habituais se beneficiam diuturnamente. Parece residir aqui o verdadeiro problema, ou seja, a discussão que realmente importa indica a necessidade de comprender as razões da violação predatória de direitos por bancos, concessionárias de serviços públicos e pelo próprio Estado.

Em nossos exemplos e em muitos outros envolvendo litigantes habituais a restrição de acesso à justiça criada pelo CNJ é mais uma vantagem para além daquelas que já ostentam (são mais experientes, desenvolvem relações informais com o Judiciário e melhores estratégias), ou seja, um preocupante desequilíbrio em detrimento dos litigantes não habituais e dos consumidores de um modo geral.

Temos aqui mais um movimento judicial de esvaziamento dos direitos fundamentais, tal como vem ocorrendo relativamente aos direitos trabalhistas,[7] o que demonstra um certo desprezo pelos direitos sociais.

Naturalmente, ninguém pode tolerar a litigância predatória – que no mais das vezes constitui crime –, tampouco o assédio judicial contra a liberdade de imprensa. Mas a Recomendação CNJ 159, por sua amplitude e generalidade, parece confundir alhos com bugalhos. Nas mãos de juízes cada vez mais assoberbados e seus sistemas de inteligência artificial, será um convite irresistível à extinção indiscriminada de processos e mais um estímulo à violação de direitos fundamentais pelos litigantes habituais.


[1] Demandas sem lastro, temerárias, artificiais, procrastinatórias, fraudulentas, desnecessariamente fracionadas, configuradoras de assédio processual ou violadoras do dever de mitigação de prejuízos, entre outras, “as quais, conforme sua extensão e impactos, podem constituir litigância predatória”.

[2] O Anexo B da Recomendação 159 sugere aos Juízes a notificação do autor “para apresentação de documentos que comprovem a tentativa de prévia solução administrativa, para fins de caracterização de pretensão resistida”.

[3] CAPPELLETTI, Mauro; GARTH, Bryant. Acesso à Justiça. Porto Alegre: Sergio Fabris, 1988

[4] Art. 10 da DUDH; art. 2º, § 3º, do Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos; arts. 8º e 25 da CADH; arts. 6º e 13 da Convenção Europeia de Direitos Humanos; art. 7º da Carta Africana de Direitos Humanos.

[5] Em 2016, tramitavam no Brasil 79,7 milhões de processos; em 2024, mais de 83 milhões.

[6] FORTES, Pedro Rubim Borges. O fenômeno da ilicitude lucrativa. Revista Estudos Institucionais, v. 5, n. 1, pp. 104-132, jan.-abr. 2019.

[7]  CASAGRANDE, Cassio; CARELLI, Rodrigo. A Suprema Corte contra os trabalhadores. Brasília: Editora Venturoli, 2025.

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