Após uma semana da reunião entre Trump e Putin, cessar-fogo ainda permanece incerto Internacional, acordo de paz, Donald Trump, Estados Unidos, negociações, Rússia x Ucrânia CNN Brasil
Não há mensagens políticas mais diretas do que os mísseis russos que atingiram uma empresa manufatureira americana na noite de quarta-feira (20), no oeste da Ucrânia, a centenas de quilômetros das trincheiras da linha de frente de uma guerra sem fim à vista.
O ataque, parte das investidas mais intensas com drones e mísseis russos contra a Ucrânia em mais de um mês, pôs fim à diplomacia obstinada de Moscou, que está paralisando os esforços de paz do presidente Donald Trump.
Faz uma semana que o presidente americano aplaudiu o presidente russo, Vladimir Putin, no tapete vermelho no Alasca. Trump fez do encontro um espetáculo, com sessões de fotos dignas de estadistas com líderes europeus, e a Casa Branca proclamou avanços impressionantes.
Mas a realidade da guerra praticamente não mudou.
A Rússia continua bombardeando e usando drones contra civis ucranianos. O país ergueu novos obstáculos à busca de Trump por uma paz rápida, contradizendo as alegações dos EUA de que fez concessões.
O que tem sido verdade nos três anos e meio desde a invasão russa, é verdade agora: Putin não quer acabar com a guerra. Uma cúpula entre líderes ucranianos e russos – com a possível presença de Trump – que o governo previu que poderia ocorrer já no final desta semana continua sendo um sonho distante.
Atrasar o acordo de paz é um dos objetivos da Rússia
As manobras de bloqueio da Rússia são lideradas pelo Ministro das Relações Exteriores, Sergey Lavrov, um mestre nas artes obstrutivas da União Soviética, que aprendeu como jovem diplomata antes da queda do Muro de Berlim.
Na quinta-feira (21), Lavrov buscou reabrir as divisões entre os EUA e a Europa que Putin havia provocado no Alasca, condenando os aliados dos EUA.
“Vejo muitos sinais de que essa atividade visa precisamente minar o progresso que começou a emergir, claramente emergindo como uma cúpula no Alasca”, disse Lavrov.
A estratégia russa é clara: atrasar a diplomacia o máximo possível para permitir que a sangrenta e lenta estratégia militar de Putin obtenha ganhos na linha de frente.
A realidade da Ucrânia também não mudou. O presidente Volodymyr Zelensky continua tentando apaziguar Trump, parecendo aberto a qualquer sugestão que ele faça. Pelo menos ele escapou de qualquer desastre durante a viagem à Casa Branca na segunda-feira (18).
Mas ele ainda não consegue aceitar a paz envenenada que Putin oferece. Ceder às demandas russas por transferências de terras estratégicas na região de Donbas prepararia Moscou para uma nova batalha no futuro. Ainda não está claro se Trump entende isso.
Trump como mediador entre os países
Os principais líderes europeus deram uma impressionante demonstração de união na Casa Branca na segunda-feira (18). Tentaram desesperadamente afastar Trump de Putin após sua enxurrada de concessões ao líder russo.
Mas o plano europeu para garantias de segurança para uma Ucrânia pós-guerra parece tão vago como sempre. E isso não pode acontecer sem Trump.
Qualquer plano desse tipo se basearia em duas estipulações. Primeira, que o Reino Unido e a França, os líderes da “coalizão dos dispostos”, estariam, se necessário, prontos para entrar em guerra — com a ajuda dos EUA — contra a Rússia para defender a Ucrânia.
E segunda, que Moscou assinaria um acordo de paz que vinculasse tropas ocidentais à Ucrânia em um acordo de defesa mútua. Ambos os cenários são fantasiosos.
Ainda assim, Trump merece crédito por injetar energia no esforço de paz. Ele é o único líder que pode dialogar com ambos os lados e que tem o poder de convocar um presidente russo aos EUA e de reunir líderes aliados em Washington num piscar de olhos.
E embora Trump frequentemente se incline para Putin em vez de seus aliados ocidentais, ele não forçou a Ucrânia à rendição que muitos de seus críticos temiam. Sua pressão sobre os aliados da OTAN para que gastem mais em defesa ajudará a garantir o futuro da Europa.
Uma conquista genuína que poderia salvar milhares de vidas na Ucrânia não está fora de questão para um presidente que anseia por respeito e pela validação da história.
E uma semana também é um tempo absurdamente curto para avaliar um esforço de paz. As iniciativas em lugares como a Bósnia e a Irlanda do Norte se desenrolaram ao longo de meses e anos de diplomacia complexa. Mas essa atenção aos detalhes é exatamente o que falta a Trump.
Ele e seu enviado Steve Witkoff, um colega empreendedor imobiliário, falam levianamente sobre a Ucrânia estar fazendo trocas de terras — sem aparentemente entender as escolhas agonizantes que isso implicaria, que estão enraizadas na identidade nacional e no sangue derramado para defender regiões importantes.
E perguntas recorrentes sobre Trump estão surgindo novamente. Por que ele não impõe a pressão americana que poderia forçar um afrouxamento da posição linha-dura da Rússia? E por que ele confia em um líder russo cujas ações merecem o oposto?
A fé de Trump em Putin foi exposta em um momento de polêmica na Casa Branca na segunda-feira (18).
“Acho que ele quer fazer um acordo comigo, entende? Por mais louco que pareça”, disse ele ao presidente francês Emmanuel Macron.
É difícil aceitar as palavras de Trump como verdade absoluta
Na quinta-feira (21), Trump pareceu demonstrar frustração com o impasse nas negociações, em uma publicação enigmática nas redes sociais que insinuou apoio aos ataques ucranianos em solo russo.
“É muito difícil, senão impossível, vencer uma guerra sem atacar um país invasor”, escreveu ele. “É como um grande time no esporte que tem uma defesa fantástica, mas não pode jogar no ataque.”
Mas uma lição da semana passada é que não é sensato enfatizar qualquer comentário isolado do presidente. Ele tem se mostrado impreciso. Em certo momento na segunda-feira (18), por exemplo, ele pareceu insinuar abertura para que tropas americanas servissem em qualquer força de reafirmação pós-guerra na Ucrânia.
Ele rapidamente recuou após o alvoroço do Maga (Make America Great Again), seus apoiadores, nas redes sociais.
Uma semana depois de se encontrar com Putin, no entanto, a reputação de Trump e a imagem de homem forte que ele cultiva incessantemente estão prontas para o constrangimento. Ele foi manipulado, mais uma vez. Isso enfraquece a lógica central de sua presidência — a de que ele é o maior negociador do mundo.
Uma coisa é pressionar nações menores com tarifas e intimidar europeus que dependem dos EUA para defesa. Mas o encontro de Trump com Putin e seu fracasso em derrotar o líder chinês Xi Jinping em uma guerra comercial sugerem que os verdadeiros durões zombam de sua mitologia da “Arte da Negociação”.
Antes de retirar da pauta sanções mais duras contra a Rússia — a mesma ameaça que provavelmente atraiu Putin ao Alasca — Trump reclamou que Putin estava pronto para negociar a paz, mas depois lançou uma saraivada de mísseis mortíferos contra a Ucrânia.
A Rússia matou nove civis na noite de quarta-feira (20), com 574 drones de ataque e 40 mísseis atingindo a Ucrânia, incluindo a cidade de Lviv, perto da fronteira com a Polônia. E 19 pessoas ficaram feridas em um ataque contra uma empresa manufatureira americana, a Flex Ltd, na região ocidental da Transcarpátia.
Vindo de uma nação tão atenta ao simbolismo quanto a Rússia de Putin, é improvável que isso tenha sido uma coincidência.
“Os russos sabiam exatamente onde estavam atacando”, disse Zelensky em seu discurso noturno em vídeo na quinta-feira (21). “Acreditamos que este foi um ataque deliberado contra propriedades americanas aqui na Ucrânia, contra investimentos americanos.”
A manipulação da Casa Branca esta semana parece ter sido planejada para encobrir a falta de progresso.
“É muito importante lembrar que, antes da vitória esmagadora do presidente Trump em novembro passado, não havia fim à vista para esse derramamento de sangue”, disse a secretária de imprensa da Casa Branca, Karoline Leavitt, na quarta-feira (20).
“Agora, pode finalmente haver luz no fim do túnel e uma oportunidade para uma paz duradoura. Isso porque o presidente Trump é o presidente da paz.”
Leavitt criticou duramente especialistas que questionaram a abordagem de Trump e acusou jornalistas de sabotar o processo para prejudicá-lo.
A falha em avaliar objetivamente os impedimentos ao processo de paz de Trump é um dos motivos pelos quais ele corre o risco de entrar em colapso. Há também a disposição do presidente em ceder às posições de Putin sem obter flexibilidade em troca, bem como a repetida falha do governo em interpretar com precisão as posições russas.
Uma área em que houve progresso é a abertura do presidente para atuar como um reforço a uma garantia de segurança europeia para a Ucrânia após a guerra, o que poderia levar pilotos americanos a voar em missões de apoio aéreo.
O secretário de Estado Marco Rubio realizou uma teleconferência sobre o assunto na quinta-feira (21) com conselheiros de segurança nacional europeus.
Rubio, que também atua como conselheiro de segurança nacional dos EUA, disse aos seus colegas que os EUA estavam dispostos a desempenhar um papel limitado, mas que a Europa deveria assumir a liderança, de acordo com um diplomata europeu na ligação.
Trump muda de posição para se igualar à de Putin
Trump planejou a cúpula em uma semana, otimista, prevendo que forjaria o cessar-fogo que, segundo a Ucrânia e a Europa, deve ser o precursor de uma diplomacia séria.
Mas, depois de algumas horas com Putin, mudou de ideia, argumentando que pressionar por um acordo de paz completo e definitivo seria melhor. Essa também é a visão da Rússia.
No fim de semana, Witkoff insistiu no programa “State of the Union”, da CNN, que Putin havia assinado garantias de segurança “robustas” para a Ucrânia como parte de qualquer acordo final.
Qualquer pessoa com conhecimento de história recente sabia que isso soava suspeito. E assim foi, com Lavrov confirmando que Moscou mantém sua posição de longa data de que deveria ser um dos fiadores — uma sugestão risível após a invasão, mas que busca consolidar o objetivo de Putin de tornar a Ucrânia um estado vassalo.
Na segunda-feira (18), Trump falou com confiança sobre um encontro entre Zelensky e Putin até o final desta semana. E disse que provavelmente participaria. Mas agora ele adotou a linha da Rússia de que um encontro bilateral entre Zelensky e Putin é o melhor.
Isso seria arriscado para a Ucrânia: é provável que o líder russo use a ausência de Trump para retratar Zelensky como intratável e culpado por atrasar a paz.
E isso se Putin aparecesse. Ele deixou claro que considera Zelensky um líder ilegítimo e que não vê a Ucrânia como um Estado independente.
De qualquer forma, Lavrov está tentando ganhar tempo. Na quinta-feira (21), ele propôs uma sequência trabalhosa de “conversas” entre “ministros especialistas” e “recomendações apropriadas” para considerar uma cúpula.