Em documento aprovado no Rio de Janeiro, bloco cobra nova fórmula de cálculo, mais voz no Fundo e fim de acordos que mantêm comando nas mãos dos países ricos Macroeconomia, BRICS, CNN Brasil Money, Cúpula dos Brics, FMI CNN Brasil
Os países do Brics fizeram um apelo neste sábado (5) por uma reforma estrutural no FMI (Fundo Monetário Internacional), cobrando que as cotas e o poder de voto dentro da instituição reflitam o peso atual das economias emergentes no cenário global.
Em documento batizado de “Visão do Rio de Janeiro para Reforma de Cotas e Governança do FMI”, aprovado durante a reunião de ministros da Fazenda e presidentes de bancos centrais do grupo, o bloco defende uma revisão urgente da estrutura do Fundo, com nova fórmula de cálculo baseada, entre outros critérios, no PIB (Produto Interno Bruto) ajustado por paridade de poder de compra (PPP).
“O realinhamento deve refletir as posições relativas dos membros na economia global, protegendo, ao mesmo tempo, as cotas dos países mais pobres”, cita o texto.
Segundo o documento, o sistema de cotas deve ser a principal fonte da capacidade de empréstimo do FMI e orientar, mas não limitar, o acesso dos membros aos recursos.
Os ministros também criticam o que chamaram de “acordo anacrônico do pós-guerra” — em referência ao pacto informal que garante a países desenvolvidos o comando das principais instituições multilaterais — e pedem mais diversidade regional na liderança do FMI.
Uma das sugestões é a criação de um novo cargo de diretor-gerente adjunto vindo de países em desenvolvimento, além de mais representatividade em cargos de média gestão e incentivo à presença de mulheres nos postos de comando.
Embora tenham concordado com o aumento de 50% nas cotas do 16º ciclo de revisão (GRQ), os países do Brics reforçaram que a real relevância virá na próxima etapa.
O grupo quer que a 17ª revisão de cotas — já em debate no Conselho de Governadores do FMI — incorpore, de fato, uma redistribuição de poder baseada na nova configuração da economia global.
“Consideraremos ações coordenadas para garantir que a 17ª GRQ e as revisões subsequentes incluam reformas significativas de cotas e de governança em consonância com esta Visão do BRICS do Rio de Janeiro”, ressalta o documento apresentado.
Preocupações com tarifas
Os ministros da Fazenda e presidentes de bancos centrais do grupo também reforçaram a preocupação com medidas unilaterais no comércio global — sobretudo barreiras e tarifas —, afirmando que as ações distorcem regras do comércio e contrariam regras da (OMC) Organização Mundial do Comércio.
“Diante deste cenário, os Brics demonstram resiliência e cooperam entre si e com outras nações para resguardar e fortalecer um sistema de comércio multilateral não discriminatório, aberto, justo, inclusivo, equitativo, transparente e baseado em regras, com a OMC no centro, evitando guerras comerciais que possam mergulhar a economia global em recessão ou prolongar o crescimento fraco”, cita o texto.
Além dos apelos por reformas globais, os países do Brics avançaram em propostas de fortalecimento interno.
Uma das principais é a criação das Garantias Multilaterais do Brics (BMG) — iniciativa que será incubada no Novo Banco de Desenvolvimento (NDB) e deve funcionar como um mecanismo para oferecer garantias a investimentos estratégicos em infraestrutura e desenvolvimento sustentável.
A ideia é usar o instrumento para atrair mais capital privado, sem exigir novos aportes dos países-membros nesta fase inicial.
O grupo também deu novos passos na agenda de integração dos sistemas de pagamento, com foco na redução de custos e maior agilidade no comércio entre os países. Um relatório técnico sobre interoperabilidade foi entregue, e as discussões devem continuar até a cúpula de 2026.
Outros pontos de destaque na declaração conjunta incluem:
- Reforço ao Acordo de Reserva Contingente (CRA), com proposta de inclusão de novas moedas e maior flexibilidade no uso;
- Avanço no conceito da Nova Plataforma de Investimentos (NIP), que deverá unir ministérios da Fazenda e bancos centrais para alinhar instrumentos de financiamento;
- Discussão sobre um sistema comum de classificação verde (taxonomias) para fomentar financiamentos sustentáveis e alinhar projetos climáticos;
- Criação de centros de excelência em alfândega e cooperação tributária, com foco em combate a ilícitos, reconhecimento mútuo de operadores e maior digitalização;
- Cooperação em inteligência artificial no setor financeiro, com um relatório pioneiro sobre regulação de IA nos bancos centrais do Brics.
O Brics defende, ainda, a ampliação de instrumentos como garantias, títulos verdes e finanças em moeda local para atrair capital privado, sem comprometer a classificação de risco dos bancos multilaterais.
Apoio à ONU na governança tributária global
Em outra frente, os países do Brics anunciaram apoio explícito à criação de uma Convenção Tributária da ONU (Organização das Nações Unidas), proposta que vem sendo defendida por países africanos e latino-americanos e enfrentando resistência de nações desenvolvidas.
No documento, o grupo afirma que a nova convenção representa uma “oportunidade histórica” para corrigir distorções no sistema tributário internacional, combater a evasão fiscal e garantir uma alocação mais justa dos direitos de tributação, respeitando a soberania dos países.
“A Convenção representa uma oportunidade histórica para melhorar a cooperação tributária internacional e garantir uma representação significativa de todos os membros das Nações Unidas, incluindo as economias emergentes e em desenvolvimento, na formulação de estruturas tributárias”, cita o texto.
Os signatários pontuaram que a “cooperação tributária internacional inclusiva e eficaz” terá como base princípios universais e compromissos que promovam compreensão mútua entre as partes.
O bloco também se compromete a combater fluxos financeiros ilícitos, revisar benefícios fiscais regressivos e fortalecer a transparência dos sistemas tributários, com foco no combate à desigualdade.
Publicado por Gabriel Bosa