Em 2017, a reforma trabalhista foi apresentada como solução a entraves econômicos. A promessa era direta: modernizar relações de trabalho, reduzir a insegurança jurídica e estimular geração de empregos. Entretanto, delegou-se ao Direito do Trabalho a responsabilidade por um problema essencialmente macroeconômico.
No processo, esqueceram-se de que reformas legais, principalmente trabalhistas, por si só, não geram crescimento econômico. Podem, no máximo, ajustar como as relações laborais se estruturam.
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O que se viu, na prática, foi uma ampliação da precarização, com novas formas de contratação que flexibilizaram direitos, mas não reverteram o quadro de estagnação econômica, queda de produtividade e redução do poder de compra.
O diagnóstico foi jurídico, mas o problema é estrutural: baixa demanda agregada, concentração de renda, carga tributária desproporcional ao lucro real das empresas e ausência de políticas industriais robustas.
Dessa forma, criou-se uma falsa dicotomia: ou se flexibiliza, ou não se contrata. Porém, sem estímulo à produção, ao consumo e à formalização, nenhuma reforma legislativa, por melhor que seja sua redação, será capaz de reverter esse quadro.
Na realidade, o modelo tradicional de trabalho, firmado sob a CLT, vem perdendo atratividade. Isso ocorre, principalmente, porque ele não oferece a contrapartida mínima a uma geração que valoriza liberdade, tempo e qualidade de vida. Imposição de jornadas fixas, deslocamentos longos e remunerações incompatíveis com o custo de vida, especialmente nas grandes cidades, faz com que cada vez mais trabalhadores optem por formas alternativas de sustento.
Além disso, a geração atual que chega ao mercado de trabalho, a chamada geração Z, cresceu vendo seus pais ausentes — não por escolha, mas por necessidade. Muitos trabalhadores cumpriam jornadas exaustivas, enfrentavam horas no transporte e, ainda assim, mal conseguiam suprir as demandas básicas da família. Tal ciclo de ausência e frustração formou uma nova mentalidade: para esta geração, estar presente, gerir o próprio tempo e ter liberdade de horário são aspectos tão essenciais quanto o ganho financeiro.
Dificuldades para contratar
Desta forma, o que se viu nos últimos anos no mercado de trabalho brasileiro foi uma realidade desconcertante: mesmo diante do desemprego estrutural, há setores que sofrem com a dificuldade de contratar. O que há por trás disso? Seriam os programas sociais os grandes vilões? Ou seriam os baixos salários e a precarização das condições de trabalho afastam as pessoas do emprego tradicional?
A resposta exige uma análise mais profunda, que envolva não apenas aspectos jurídicos e sociais, mas também estruturas macroeconômicas as quais impactam diretamente a dinâmica do emprego.
Por conta disso, diante da ausência de opções realmente atrativas no mercado de trabalho formal, o brasileiro criou o seu próprio caminho, com um termo que muito explica esse comportamento: a “sevirologia”, ou seja, a arte de “se virar”.
A “viração” tornou-se prática cotidiana: vender produtos, prestar pequenos serviços, atuar em plataformas digitais, empreender com o que se tem. Embora informal, essa lógica representa uma forma de resistência, autonomia e sobrevivência. E, surpreendentemente, tem se mostrado mais rentável e flexível que o contrato tradicional, em muitos casos.
Possíveis soluções ao quadro atual
Diante deste cenário, os sindicatos patronais, conectados com os anseios e dificuldades de suas bases de representação, têm papel crucial na construção de soluções realistas e eficazes. Longe de se limitarem à defesa da redução de encargos ou à flexibilização das regras, essas entidades têm procurado assumir o protagonismo nas negociações coletivas. ao proporem modelos inovadores de contratação, valorização e incentivo à formalização, que estejam em sintonia com a nova realidade do trabalho.
Algumas propostas viáveis incluem:
- criação de pisos regionais e progressivos, atrelados a metas de produtividade;
- cláusulas de remuneração variável com garantia mínima, para atrair perfis que desejam ganhos proporcionais ao esforço;
- banco de horas com ampla previsibilidade e transparência, conciliando liberdade de horário com responsabilidade empresarial;
- estímulo à contratação por tempo parcial ou intermitente, com cláusulas protetivas que evitem abusos.
Destacam-se, ainda, os incentivos à capacitação profissional, vinculados à formalização do vínculo empregatício. Trata-se de medidas que podem ser inseridas nos instrumentos normativos coletivos, como forma de atrair trabalhadores e combater a informalidade com inteligência negocial.
Ademais, é papel das entidades patronais interceder junto ao poder público por políticas que favoreçam o emprego formal sem penalizar o pequeno e médio empresário.
Há estratégias que precisam ser articuladas em conjunto, por meio de um diálogo institucional permanente, como, por exemplo:
- redução de encargos sobre a folha;
- acesso facilitado ao crédito, vinculado à criação de postos de trabalho formais;
- premiação tributária para empresas que aderirem a cláusulas convencionais as quais ampliem a formalização, com proteção social mínima.
Por fim, a conclusão que chegamos é de que a dificuldade de contratação que hoje assusta o setor produtivo é reflexo direto de uma economia que não cresce de forma inclusiva e de um modelo de trabalho que não se renovou suficientemente.
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A saída para esta crise não está em culpar os programas sociais nem em criminalizar o trabalhador informal. Está, sim, em olhar o trabalho e o setor produtivo com a dignidade que eles merecem e em construir, por meio da negociação coletiva, novos pactos que valorizem a formalização sem sufocar a liberdade que as novas gerações reivindicam.
O desafio, portanto, é coletivo: estado, empresas, sindicatos e trabalhadores precisam entender que novas lógicas do trabalho exigem flexibilidade com segurança, liberdade com responsabilidade e valorização com respeito. É nesse equilíbrio que reside o futuro do trabalho – e a sustentabilidade de todo o sistema produtivo, protegendo postos de trabalhos e trabalhadores.