A polêmica da hospedagem em Belém pode acabar esvaziando a COP30 e, no limite, inviabilizar a cidade como sede para a conferência em novembro. O problema é motivo de irritação de delegados de quase todas as regiões representados na 62ª reunião dos Órgãos Subsidiários da ONU (SB62), que acontece desde a semana passada em Bonn. E se a questão não for resolvida o mais rápido possível, o Brasil pode receber do Secretariado da Convenção-quadro das Nações Unidas para Mudança do Clima (UNFCCC) pedido formal para que mude a sede para outra cidade brasileira.
A mensagem foi dada à delegação do Brasil em Bonn pelo Büro, o órgão composto por representantes de todas as regiões geográficas, segundo informaram fontes de dentro do próprio governo brasileiro e representantes das delegações. Só quem pode mudar a sede é o próprio Brasil. E certamente não é isso o que querem governos federal, estadual e dos municípios do entorno de Belém. Seria péssimo para a imagem deles e do país, doméstica e internacional, sem falar no volume de recursos gastos até aqui. Só o governo federal destinou cerca de R$ 4,5 bilhões para a COP em Belém.
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Já aconteceu de um país anunciar a mudança da sede de última hora. Foi em 2019, quando o Chile, a três meses da COP25, resolveu passar a conferência de Santiago para Madri. O motivo foram manifestações no país. E não é a primeira vez que a hospedagem cria incertezas e insatisfação entre os delegados. Foi assim na COP26 de Glasgow, no Reino Unido.
Já havia muitas dúvidas nesses últimos meses, mas o clima azedou nos últimos dias. Os delegados das mais de 190 nações representadas em Bonn não escondem a preocupação com a falta de informações sobre onde se hospedar, a que preços e como será a mobilidade durante a conferência. Todas as regiões manifestaram reclamações em reuniões sobre logística e sobre a substância das
negociações da COP30 em si.
O custo das diárias nos hotéis que mostram disponibilidade estaria em pelo menos cinco vezes o valor da diária concedida pela ONU, de US$ 145, segundo relatou uma chefe de delegação europeia ao governo brasileiro durante o briefing logístico sobre a COP30.
Outra queixa recorrente é sobre as regras de cancelamento ou mudanças em reservas, como relataram alguns delegados durante o briefing da logística.
O governo tem tentado negociar com os representantes da rede hoteleira e do setor de turismo, sem sucesso. O caso foi levado ao Ministério da Justiça por meio da Secretaria Nacional do Consumidor (Senacom), que está pedindo a hotéis e outros alojamentos dados sobre os valores cobrados de aluguéis nos últimos cinco anos, sobretudo no período do Círio de Nazaré, o grande evento realizado todos os anos em Belém, que reúne 2,5 milhões de pessoas na cidade.
Se confirmado o abuso, podem ter de pagar multas e até serem obrigados a fechar as portas. Mas, seguindo-se os trâmites legais, as penalidades só viriam depois da COP30. Segundo o Secretário Especial da COP30, Valter Correia, responsável pela logística, nada acima dos valores cobrados no Círio é razoável. É nisso que aposta o governo para levar o setor à mesa de negociações.
O grupo de países da África pediu a mudança de sede. Existe inclusive demanda por subsídios para que as nações mais pobres possam participar do que seria uma conferência de todos. Sem poder garantir ainda o número de quartos prometidos, o governo afirma que ninguém ficará sem hospedagem de qualidade e a preços decentes. A Secretaria Especial da COP30 ainda está fazendo levantamento do que está disponível entre as 30 mil opções que garante que existem. A previsão é a de que uma primeira leva com 2.500 opções estaria disponível ainda em junho na plataforma que o governo havia prometido no anunciar dois meses atrás.