A defesa de Anderson Torres vem tentando, via depoimentos das testemunhas, desconstruir a ideia de um intuito golpista enquanto ele era o responsável pelo Ministério da Justiça e Secretaria de Segurança Pública do Distrito Federal. Embora as testemunhas confirmem fatos trazidos na denúncia da Procuradoria-Geral da República (PGR), os advogados tentam normalizar as ações de Torres como procedimentos comuns aos cargos ocupados e não direcionados a uma trama golpista.
As testemunhas indicadas por Torres começaram a ser ouvidas nesta terça-feira (27/5) no Supremo Tribunal Federal (STF) na ação penal sobre a trama golpista (AP 2668). O ex-ministro foi quem mais indicou testemunhas entre os réus – até agora as indicações somam 36 pessoas.
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Torres ocupou postos estratégicos no governo federal e no DF e suas ações e inações seriam peças importantes para a consolidação da tentativa de golpe de estado em 2022. Por isso, ele é apontado pela PGR como um dos protagonistas da trama do golpe.
Entre as passagens que comprometem Torres estão a descoberta da minuta golpista em sua casa pela Polícia Federal, as blitzes em rodovias para impedir a votação de eleitores de Luiz Inácio Lula da Silva e a omissão da segurança pública do Distrito Federal nos atos de depredação dos prédios da Praça dos Três Poderes no dia 8 de janeiro.
Um trecho específico da denúncia da PGR esteve em praticamente todas as perguntas feitas pelo advogado Raphael Vianna de Menezes, que conduziu as oitivas pela defesa de Torres nesta terça-feira (27/5). Trata-se da citação de diálogos mantidos em um grupo de WhatsApp chamado “Em off” sobre uma reunião no dia 19 de outubro de 2022 em que foram definidos o uso de “policiamento direcionado” pela Polícia Rodoviária Federal (PRF) para impedir que eleitores de Lula chegassem às cabines de votação no 2º turno.
O trecho traz uma conversa do delegado da Polícia Federal Fernando de Sousa Oliveira e Marília Ferreira de Alencar, ex-subsecretária de inteligência, no dia 20 de outubro de 2022, em que comentavam a reunião do dia anterior. Marília comentou: “Achei que o 01 falou bem ontem na reunião“. Na sequência, Fernando respondeu: “Falou bem demais isento”. E a mulher asseverou: “Isento porra nenhuma”, “meteu logo um 22”. Na avaliação do PGR, Paulo Gonet, os diálogos indicam que Anderson Torres foi “operoso na concretização do plano insidioso”.
O advogado tentou que as testemunhas afastassem a ideia de que o 22 estaria ligado ao então presidente Jair Bolsonaro, pois era o seu número nas urnas e questionou se sabiam do “plano insidioso”. Assim como tentou afastar a ideia de que as blitzes nas estradas tinham por objetivo embaraçar as eleições de 2022.
O ex-diretor de operações da PRF Djairlon Henrique Moura confirmou que recebeu ordens do Ministério da Justiça, liderado por Torres, para fazer blitzes em ônibus com destino à região Nordeste durante o segundo turno das eleições de 2022. De acordo com Moura, contudo, o objetivo não era dificultar o acesso de eleitores à votação, mas fiscalizar transporte irregular de eleitores e de dinheiro de veículos saídos de São Paulo e do Centro-Oeste.
O ex-chefe de gabinete de Torres, Marcos Paulo Cardoso, informou que Torres nunca objetivou interferir no pleito e que nunca trabalhou “em detrimento de A ou B [candidatos]”. Segundo ele, todas as ações foram planejadas para o Ministério da Justiça dar integral apoio à Justiça Eleitoral e reprimir eventuais crimes.
A defesa tentou afastar de Torres a responsabilidade pelo 8 de janeiro – ele era o secretário de segurança pública do DF, estava viajando no momento das invasões e a omissão policial facilitou a depredação. O advogado questionou à coronel Cintia Queiroz de Castro, ex-subsecretaria de Operações Integradas da Secretaria de Segurança Pública do DF, se Torres sabia do planejamento para proteger a Praça dos Três Poderes e, ela disse que sim, assim como afirmou que o plano não foi executado conforme o planejado.
Sobre a live feita por Jair Bolsonaro contra as urnas eletrônicas promovidas em julho de 2021, a defesa tentou pregar a narrativa que Torres foi convocado pelo ex-presidente, portanto, teria que ir. Contudo, as testemunhas ouvidas não conseguiram confirmar o tom oficial do convite. De acordo com a PGR, o ex-ministro da Justiça contribuiu para a propagação de notícias inidôneas sobre o sistema eletrônico de votação, ao discorrer sobre possíveis recomendações sugeridas por peritos da Polícia Federal quanto ao processo de contabilização de votos.
Até o momento, a defesa de Anderson Torres avalia como maior vitória a declaração do ex-comandante da Aeronáutica, Baptista Jr, testemunha de acusação, que disse, na semana passada, que a única retificação que faria em relação ao seu depoimento na Polícia Federal é que Anderson Torres não participou das reuniões com o ex-presidente Jair Bolsonaro e os comandantes das Forças Armadas.