Ao CNN Money, Diego Barreto afirma que ofertas por informações sensíveis chegam a R$ 5,5 mil; alvos miram executivos de Negócio, Tecnologia e Comercial Negócios, 99, CNN Brasil Money, Delivery, espionagem, estilo-cnn-money, iFood, plataformas, Rappi CNN Brasil
Em meio ao cenário de investimentos bilionários e a entrada de novas plataformas no mercado de delivery brasileiro, o iFood está sendo alvo de um “ataque coordenado e sistemático” de espionagem, afirmou o CEO da companhia, Diego Barreto, em entrevista ao CNN Money.
Sem citar nomes, ele disse que foram registradas mais de 170 mensagens nos últimos meses, encaminhadas por consultorias nacionais e internacionais, mirando principalmente executivos das áreas de Negócio, Tecnologia e Comercial.
As ofertas, que Barreto classifica como um “processo de assédio estruturado e cadenciado”, partem de pedidos de entrevista sobre o mercado, escalando para informações sensíveis da companhia, como dados de faturamento, modelos de precificação e estratégias de investimento.
Os valores ofertados variam de US$ 250 a US$ 400 — cerca de R$ 1,3 mil a R$ 2,1 mil — por uma hora de conversa. Em outros casos, o CEO afirma que consultorias chegaram a oferecer R$ 5,5 mil por informações.
“Tudo isso mostra uma tentativa clara de ‘espionagem corporativa’ para obter informações estratégicas do iFood, de maneira ilícita e antiética”, diz.
Registros que o CNN Money teve acesso mostram que abordagens foram feitas por e-mail e mensagens no LinkedIn.
Em uma conversa na rede social, um funcionário do iFood é questionado sobre mudanças na estrutura organizacional e operações de negócios.
Ao fim da mensagem, o remetente explica que o pagamento é feito após o término da “colaboração”, em um prazo de até 15 dias úteis.
Já em outra abordagem via e-mail, o representante de uma companhia internacional oferece uma chamada de vídeo de até duas horas para falar sobre a base de clientes do iFood e estratégias de preços.
O consultor oferece US$ 350 — aproximadamente R$ 1,8 mil —, com pagamento feito via transferência bancária ou PayPall.
Segundo o CEO, protocolos internos de segurança e compliance foram reforçados. Ele afirma também que o iFood já encaminhou o caso para autoridades nas esferas civil e criminal.
“O mercado brasileiro de delivery é um dos mais competitivos e inovadores do mundo, e naturalmente desperta interesse global. Mas esse interesse precisa se materializar em concorrência leal, com respeito à ética e às leis”, diz Barreto.
O CNN Money entrou em contato com as principais plataformas de delivery do Brasil.
Em nota, a 99Food disse que “não está conduzindo ou participando de qualquer iniciativa que envolva a interação com profissionais do mercado de delivery, com o intuito de realizar consultoria ou qualquer tipo de obtenção de informações”.
A Rappi afirmou que não vai comentar o assunto.
A Keeta não respondeu até o fechamento desta reportagem.
A pedido de Barreto, a entrevista foi feita por escrito. Leia na íntegra:
Funcionários do iFood relataram para a empresa a procura de consultorias ou terceiros em busca de informações em troca de dinheiro?
Ao longo dos últimos meses, recebemos relatos consistentes de colaboradores que foram procurados por consultorias nacionais e internacionais oferecendo dinheiro em troca de informações sigilosas sobre o iFood.
Esse tipo de assédio ocorreu principalmente via LinkedIn, em inglês, e por e-mail corporativo, tendo como alvo principalmente executivos das áreas de Negócios, Tecnologia e Comercial.
Nosso time de Compliance consolidou mais de 170 mensagens desse tipo, enviadas por mais de 30 consultorias diferentes, o que demonstra um ataque coordenado e sistemático contra o iFood.
Como nem tudo foi reportado, nós estimamos que devem ter sido mais de 500 pedidos de consultorias assediando nossos funcionários. Essa semana mesmo tivemos novas mensagens enviadas por consultorias baseadas na China.
O que era pedido e o quanto de dinheiro foi ofertado?
O que observamos nessas atuações foi um processo de assédio estruturado e cadenciado. Inicialmente, aparecem convites para entrevistas genéricas sobre a indústria. Com o tempo, esses pedidos iam se tornam mais específicos, trazendo perguntas claramente ligadas ao iFood.
Na sequência, as questões passam a ser mais focadas em produtos e negócios da companhia, com interesse em informações muito sensíveis, como números de faturamento, margens de lucro, modelo de precificação, volume de pedidos e até estratégias de investimento e inovação.
Em todas essas mensagens, eram oferecidos entre US$ 250 e US$ 400 por hora de conversa. O ápice do esquema são pedidos disfarçados de ofertas de entrevista de emprego, pagando até R$ 5,5 mil por hora.
Isso é absolutamente bizarro: não existe racionalidade em alguém pagar para que uma pessoa faça uma entrevista de emprego. Tudo isso mostra uma tentativa clara de “espionagem corporativa” para obter informações estratégicas do iFood, de maneira ilícita e antiética.
Como o iFood está lidando com essas supostas tentativas de espionagem? Houve denúncia para órgãos oficiais?
O iFood repudia esse tipo de prática para tentar obter informações sigilosas, o que, inclusive, é crime segundo a legislação brasileira. Já notificamos extrajudicialmente as consultorias envolvidas e também concorrentes que tiveram seus nomes mencionados em abordagens.
Estamos tomando medidas cabíveis no âmbito civil e criminal para proteger a empresa, nossos colaboradores e parceiros. Além disso, comunicamos formalmente os fatos às autoridades competentes. A polícia também está envolvida e dois mandados de busca já foram emitidos pela Justiça. O cerco está se fechando.
Há algum movimento interno para investigar e mitigar esse tipo de abordagem?
Reforçamos todos os nossos protocolos internos de segurança e compliance, emitimos orientações para que colaboradores reportem imediatamente qualquer tentativa de assédio e criamos fluxos dedicados de resposta rápida.
O iFood já tem uma cultura sólida que preza pela transparência e pela ética, e estamos ampliando processos, treinamentos e canais de denúncia para seguir garantindo que nenhuma prática ilícita prospere.
Quais os principais riscos que essas supostas tentativas de espionagem trazem para a operação do iFood?
O primeiro risco, claro, é a tentativa de conseguir informações estratégicas, que são fruto de 14 anos de investimento, inovação e trabalho de milhares de pessoas, para ter algum tipo de vantagem competitiva, criando um cenário de concorrência desleal.
Mas, nesse caso, estamos seguros que a estratégia da empresa está bem protegida e que os concorrentes dificilmente terão condições de replicá-las, já que funcionam a partir de um contexto maior, que inclui a cultura do iFood, uma empresa que vive e conhece o mercado brasileiro, há quase quinze anos.
A meu ver, tem um outro risco que é o estímulo à criação de ambiente de vale-tudo num setor tão importante para a economia brasileira, como o de delivery. Por isso, para nós, manter o sigilo das nossas informações estratégicas é tão importante quanto fomentar um ambiente ético e transparente, em linha com o que se espera de empresas que querem o melhor para o setor.
O que esse tipo de ação diz sobre o atual cenário de delivery no Brasil, que recentemente passou por investimentos bilionários e a entrada de novas plataformas?
O mercado brasileiro de delivery é um dos mais competitivos e inovadores do mundo, e naturalmente desperta interesse global. Mas esse interesse precisa se materializar em concorrência leal, com respeito à ética e às leis.
Quando empresas recorrem a práticas ilegais de espionagem, revelam fraqueza estratégica e desrespeito às regras de mercado. O iFood vai continuar investindo no Brasil — já anunciamos R$ 17 bilhões no nosso ano fiscal de 2026 —, gerando empregos e fortalecendo a economia de forma correta e transparente.