Já trouxemos a experiência do primeiro mês com o Fiat Pulse Hybrid e nossa frustração com o funcionamento irregular do sistema híbrido. Se até então havíamos visto relatos apenas em grupos de proprietários – chegaram mais algumas dezenas, por meio dos comentários e e-mail, com histórias semelhantes tanto com o Pulse quanto com o Fastback com mesma mecânica.
Por e-mail, o leitor Charles Machado contou que seu Fastback Impetus Hybrid fica sem o impulso elétrico sempre que para por algumas horas. E, se fica parado por um dia, leva duas horas para o carro voltar a funcionar como um híbrido leve.
“Fui viajar na segunda semana de janeiro, deixando o carro parado por sete dias. Eu voltei e não funcionava a recarga (não aparecia mais a barrinha verde no painel), o start-stop também parou de funcionar, e logicamente o auxílio elétrico nem dava sinal de vida. A bateria de lítio indicava 100% no painel… Porém, não temos acesso ao nível da bateria de chumbo. Rodando o primeiro dia, voltou a funcionar depois de algumas horas a regeneração (barra verde). No segundo dia, voltou o start-stop. No terceiro dia, já tinha rodado bastante, voltou o auxílio elétrico”, disse.


No YouTube, o usuário @rodrigoruiz relatou que o sistema híbrido do seu Fastback deixou de funcionar após ficar parado por dois dias e permaneceu assim por vários dias. “Em um mês com o carro, o sistema funcionou por no máximo dez dias”, afirmou.
Rodrigo levou o carro à concessionária, onde disseram que o veículo estava normal, mas fizeram uma atualização do sistema híbrido, que funcionou continuamente por sete dias até ficar um dia e meio parado.
A maioria dos relatos tem uma situação em comum: a assistência elétrica deixa de atuar se o carro fica um ou mais dias parado. Além disso, pode demorar dias para que o sistema volte a trabalhar plenamente a depender do uso, como aprenderíamos ao longo da apuração.
Nós compilamos os casos e questionamos a Fiat sobre essas situações tão semelhantes procurando entender as causas e como resolver a questão. Em um primeiro momento, a fabricante não explicou, disse que a situação detectada por nós era uma característica de produto e que estaria utilizando a telemetria dos carros com serviços conectados (como o nosso) para reunir informações sobre o uso dos carros para futuras evoluções do sistema.
Depois, porém, a fábrica retomou a conversa conosco (que queríamos entender que característica de projeto era essa que faz com que o carro não funcione do modo que se espera). Conseguimos conversar com especialistas da Stellantis (dona da Fiat).
ISSO A FIAT NÃO MOSTRA
É importante saber que os indicadores de carga e regeneração do quadro de instrumentos dizem respeito apenas à bateria de lítio, aquela instalada sob o banco do motorista. Toda vez que o impulso do motor elétrico (BSG) não funciona, o indicador de carga mostra a bateria cheia.
O que não está explícito nem mesmo no manual do carro é que o funcionamento do sistema híbrido leve de 12 V não depende apenas da bateria de lítio. A de chumbo EFB de 68 Ah, que está alocada ao lado do motor, também precisa ter plena carga.
“É claro que se o consumidor atinge certos níveis de carga da bateria e (esses níveis) são menores (que o estipulado pela programação eletrônica do carro), ou por parada ou por uso com menos quilometragem ou regeneração, o sistema entra numa faixa de carga que desabilita a regeneração momentaneamente”, explica Aroldo Borges, diretor adjunto de Engenharia da Stellantis.
O sistema voltará a funcionar assim que as baterias alcançarem novamente os níveis adequados de carga – o que dependerá do potencial de regeneração do percurso do usuário.
“Isso atende a grande maioria dos consumidores, considerando a quilometragem média e o uso urbano, principalmente, trazendo redução no consumo e emissões”, completa o diretor da Stellantis.
A grande maioria não é todo mundo, porém. Nós estamos percebendo que o sistema atua melhor em condições de trânsito livre ou um pouco mais pesado, mas não tem muitas chances de regenerar energia no anda e para de um congestionamento, por exemplo, pois a regeneração de energia só funciona em reduções ou frenagens acima dos 22 km/h, como forma de preservar o câmbio CVT e evitar trancos.
Voltando às baterias, o Manual do Proprietário diz que “a bateria auxiliar de íons de lítio se recarrega para garantir que o nível de carga esteja sempre próximo a 50% do nível máximo, para aproveitar todos os recursos do sistema Hybrid 12 V e, ao mesmo tempo, ter sempre uma capacidade útil para a operação de recuperação de energia”, mas não informa a dependência da carga da bateria de chumbo, que nem sequer pode ser acompanhada pelo condutor.]
Questionamos qual seria o estado de carga ideal das baterias para que o sistema funcione e qual nível de carga da bateria de chumbo leva a desabilitar as funções do sistema (assistência elétrica, regeneração e start-stop), mas a Stellantis se negou a compartilhar essas informações por considerá-las “estratégicas”. Um boletim enviado às concessionárias, contudo, informa que a bateria de chumbo precisa estar com carga acima de 80% e a de lítio, acima de 30%. Isso diverge do manual do carro.
Aroldo explica que a assistência elétrica é desabilitada em função da carga com o intuito de preservar a vida útil das baterias. Longas paradas fazem com que as baterias percam carga naturalmente, seja por conta de sua química, seja pelo consumo de eventuais sistemas do carro. “O motor vai continuar dando partida, mas enquanto o carro não voltar ao uso contínuo, essa carga vai poder chegar a um limite, nessa ordem de poder desabilitar momentaneamente uma ou duas funções, e também o start-stop. Ao trazer o nível de carga que ativa de novo os sistemas, ele volta a ter assistências”, afirma.
É isso que está acontecendo com os carros e, de fato, é uma característica do projeto, que é mais simples que o de todos os outros híbridos leves disponíveis no mercado brasileiro. “Em nenhum nós detectamos qualquer tipo de diferença para aquilo que foi projetado”, diz Alexandre Sousa, responsável da Stellantis pela experiência dos clientes e por pós-venda para a América do Sul, após relatar que estão acompanhando a telemetria das unidades com internet 4G.
EM BUSCA DE UMA SOLUÇÃO
Outra diferença para quase todos os híbridos leves à venda no Brasil, inclusive os 48 V, é que os Fiat se dispõem a apresentar o funcionamento do sistema no quadro de instrumentos. É legal para provar os efeitos da tecnologia, mas acaba frustrando por não indicar a condição da bateria de chumbo.
O carro não apresenta uma mensagem ou uma luz indicativa para esclarecer se o sistema de assistência elétrica está plenamente atuante ou se a bateria de chumbo está com carga. Se o start-stop for desabilitado por falta de energia, porém, o motorista é avisado – conosco, aconteceu uma vez.
Aí voltamos a um ponto importante. O tempo para a carga retornar aos níveis ideais depende totalmente do tipo de utilização do veículo.
“Não existe um parâmetro de tempo puro. A central percebe o nível de carga das baterias e a demanda elétrica. Eu posso estar fazendo o uso em autopista, fazendo recarga constante, mas sem fazer o uso da assistência elétrica, porque é nas acelerações em centros urbanos que ele mostra seus benefícios ao consumidor”, explica Aroldo.

“Nós estamos pensando em como poder melhorar esse ajuste, mas isso é trabalhar em ajustes finos, porque temos que pensar na vida útil da bateria como um todo”, completa.
“Você realmente vê a bateria de lítio carregada no quadro de instrumentos, mas a bateria de chumbo não tem um mostrador específico, isso é normal nos carros normais hoje, por mais que possa mostrar a tensão, não mostra o estado de carga da bateria. Então, como as duas (baterias) estão conectadas, justamente esse foi um ponto que os clientes trouxeram”, explica Alexandre.
“Realmente, a bateria de lítio está carregada, mas como o sistema é conectado com a bateria de chumbo, qualquer uma das duas pode oscilar e levar a uma momentânea desabilitação do sistema. Uma vez que essa bateria de chumbo volta à carga, o sistema volta a operar. Esse é um ponto que nós estamos avaliando aqui com os dados que temos”, explica o responsável pelo pós-venda.
“É uma das coisas que a gente capturou, que essa relação homem-máquina pode ser melhorada e estamos trabalhando para entender a melhor forma de fazer. Mas, como é um balanço energético das duas baterias, imagine eu colocar dois mostradores para as duas baterias. Será uma confusão. Então vamos escolher o melhor meio para informar o consumidor”, esclarece Aroldo Borges.
“A única coisa que pode estar gerando essa dúvida é o mostrador da bateria de lítio não estar perfeitamente conectado com o estado de carga das duas baterias, esse é o grande ponto que nós estamos analisando também porque dá uma falsa impressão de defeito. Mas não é defeito, é uma fase em que o sistema está regenerando, recarregando a bateria de chumbo também”, completa o engenheiro.
Esta atualização prometida pela Fiat estaria, portanto, vinculada a uma forma de passar para o motorista a condição de funcionamento de uma forma mais objetiva e clara.
“Não tem sentido a gente carregar o HMI (Human Machine Interface, ou as telas do carro) com vários gráficos de bateria, mas a gente precisa comunicar melhor para o cliente como o sistema está funcionando e é isso que nós estamos avaliando agora com esses feedbacks que os clientes nos deram, que foi importante para a gente entender onde a gente pode evoluir nessa comunicação ali no quadro de instrumentos e agora estamos discutindo com os especialistas internos como executar isso da melhor forma”, completa Alexandre.
Os trabalhos para essa atualização, com coleta de dados e simulações, ainda estão acontecendo e não têm um prazo para serem concluídos. Questionados sobre a necessidade de levar o carro à concessionária para receber a atualização, dizem que ainda não há uma definição. Contudo, é bom ter em mente que o que a Fiat vai fazer é deixar o sistema funcionando de forma mais transparente, mas a limitação das funções em função das cargas tende a ser mantida para não comprometer a vida útil da bateria de chumbo.
Enquanto essa atualização não é disponibilizada, nós descobrimos novos comportamentos do nosso Pulse Hybrid. Quando o start-stop é inibido (pelo freio ou pelo câmbio nas posições N ou P) e o motor 1.0 turbo não desliga, o BSG, funcionando como um alternador, consegue elevar a carga da bateria de lítio de dois traços à carga completa em um minuto. Mas é deixando o motor desligado que se economiza mais combustível.
Fiat Pulse – 3.384 km
Versão: | Impetus T200 Hybrid |
Motor: | 3 cil., diant., transv., 999 cm3, 12 V, aspirado, 130/125 cv a 5.750 rpm, 20,4 kgfm a 1.750 rpm |
Câmbio: | automático, CVT, 7 marchas, tração dianteira |
Seguro: | R$ 1.425 (Perfil Quatro Rodas) |
Revisões: |
Até 100.000 km: R$ 8.622 |
Gastos no mês: | Combustível: R$ 1.301,81 |
Consumo: | No mês: 13,2 km/l com 48% de rodagem na cidade
Desde dez/24: 13,5 km/l com 57,2% de rodagem na cidade |
Combustível: | flex (gasolina) |