O Supremo Tribunal Federal (STF) realizou a última audiência do Marco Temporal das Terras Indígenas. No saldo de nove meses de discussão e 23 encontros estão poucos consensos, itens controversos em aberto e dúvidas entre os participantes sobre a efetividade das discussões.
Se por um lado ficou acordado que é preciso melhorar o processo de demarcação de terras no Brasil, por outro, não ficaram definidos novos parâmetros. Se houve consenso no pagamento da indenização, não ficou claro quem vai pagar a conta, quem terá direito ao montante e o que deve ser pago – terra nua e/ou benfeitorias.
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O governo federal ficou de apresentar o Plano Transitório de Regularização das Terras Indígenas, mas ainda não o fez. Até mesmo o polêmico projeto de mineração em terras indígenas não foi descartado, nem decidido. A solução foi jogar o problema para a frente e a discussão será feita em outro processo do Supremo. Enquanto isso, os relatos de violência no campo persistem entre indígenas, fazendeiros e servidores da Funai.
O tímido avanço do diálogo ficou sedimentado na intervenção do representante da agricultura Marcelo Bertoni. Em meio aos agradecimentos dos juízes auxiliares Diego Veras e Lucas Faber sobre as conquistas “possíveis” na mesa de negociação no STF, Bertoni pediu a palavra, se mostrou decepcionado, lamentou os poucos ganhos da conciliação e concluiu: “Mas eu tenho certeza que tem muita coisa que a gente poderia ter feito aqui dentro e que provavelmente vai ser feito no Congresso”.
A fala de Bertoni não foi bem recebida pelos integrantes da mesa de conciliação, pois passou o recado que mesmo diante de todo o esforço conciliatório no Supremo, o Congresso pode ser chamado para a palavra final, o que pode diminuir a margem de alteração da lei.
O futuro das contribuições da mesa de negociação ainda é incerto. A ideia inicial seria enviar as sugestões gestadas no STF para melhorias legislativas, mas agora o ministro Gilmar Mendes avalia como vai tratar os frutos da conciliação.
Desde o começo, o gabinete do ministro sabia das dificuldades dessa conciliação. A primeira dúvida era a possibilidade de colocar direitos indisponíveis indígenas em negociação. Depois, instalou-se o clima de conflito e dúvidas sobre a legitimidade da mesa, principalmente quando as principais representações indígenas deixaram a negociação.
Mas Gilmar insistiu, marcou mais encontros, fez aparições estratégicas nas reuniões, pediu paciência aos envolvidos, subiu o tom com opositores, criticou “bolhas ideológicas”, políticos e organizações não governamentais. Ainda assim, o saldo ficou aquém do esperado.
Agora resta aos envolvidos observar as próximas movimentações, principalmente do governo federal – até que ponto a União está disposta a bancar os custos da conciliação. Por enquanto, não há consenso sobre as indenizações nem dentro do governo Lula e o assunto está nas mãos da Casa Civil, de Rui Costa. A ministra do Planejamento, Simone Tebet, também foi acionada.
Enquanto isso, a Lei 14.701/2023, que instituiu a data de 1988 como marco de ocupação para o direito à demarcação de terra por povos indígenas, continua válida. Como temia desde o princípio as representações indigenistas e o que os levou a desistir da conciliação proposta pelo Supremo.