Geralmente, o processo de seleção natural leva milhares de anos Tecnologia, Evolução, Genética, USP (Universidade de São Paulo) CNN Brasil
Um estudo liderado por pesquisadores da Universidade de São Paulo (USP) analisou o genoma de 2.723 brasileiros, de diferentes regiões, criou um mapeamento genético inédito no Brasil e identificou uma seleção natural de genes em apenas 500 anos de história do país.
A pesquisa, publicada na revista Science, mostrou que três genes associados a fertilidade, imunidade e metabolismo energético sobreviveram ao processo de colonização e à intensa miscigenação que aconteceram no território brasileiro. A questão é que, quando se fala em seleção natural na ciência, o prazo esperado é de milhares de anos até a observação de um fenômeno que foi registrado em um período tão curto por aqui.
“É um processo que a gente pensa em milhares de anos, mas esse embaralhamento da colonização foi tão forte, do ponto de vista demográfico, de número de pessoas, que parece ter acelerado alguns processos. A gente consegue ver seleção natura no espaço de 500 anos e isso é realmente incrível”, afirmou Tábita Hünemeier, professora do Departamento de Genética e Biologia Evolutiva do Instituto de Biologia da USP e pesquisadora do Instituto de Biologia Evolutiva (CSIC/UPF) da Espanha.
Segundo Hünemeier, o sistema imunológico está relacionado a uma ancestralidade africana, o sistema de metabolismo energético teria vindo dos povos indígenas e a fertilidade foi herdada dos europeus. “É algo que lá atrás fazia sentido para a sobrevivência desses indivíduos”, complementou.
O estudo mostrou um retrato profundo e histórico da miscigenação no Brasil e encontrou mais de 8,7 milhões de variantes genéticas que nunca havia sido identificadas antes. O número é reflexo do fato de esse ser o primeiro mapeamento genômico de larga escala no Brasil, já que a produção de conhecimento na área está muito concentrada nos Estados Unidos, Europa e, mais recentemente, na Ásia.
“Você nunca vai identificar uma variante genética ligada a uma doença se essa variante não estar na população que você está estudando. Se eu estudar europeus, não vou identificar uma variante africana porque a África tem uma história evolutiva diferente. A América tem uma história evolutiva diferente e isso tudo levou a acúmulo de diversidade”, declarou Tábita Hünemeier, professora do Departamento de Genética e Biologia Evolutiva do Instituto de Biologia da USP e pesquisadora do Instituto de Biologia Evolutiva (CSIC/UPF) da Espanha.
“O primeiro ponto, para qualquer diagnóstico ou para qualquer estudo, é entender a população que estamos estudando.”
Impactos da genômica na saúde
Segundo Hünemeier, essa pesquisa é um primeiro grande passo para o desenvolvimento da medicina no Brasil. O ramo pode se beneficiar da análise genômica justamente porque os órgãos de saúde terão mais sedimento para direcionar políticas públicas e compreender melhor as particularidades da população brasileira e, em último caso, de cada indivíduo na medicina de precisão.
“O caminho é longo, mas agora a gente tem um caminho. Tínhamos estudos mostrando mais ou menos a diversidade genômica, mas nunca nesse nível de detalhe. A diversidade vai aumentando e a gente começa a ter a capacidade de pensar em alternativas de saúde pública, de entender a população, de entender os grupos”, disse.
“Essas 8 milhões de novas variantes podem, potencialmente, estar relacionadas com doenças. É hora de olhar essas mutações, ver o impacto disso na saúde.”
“A gente deve estabelecer um parâmetro aqui. Embora a população tenha algumas porcentagens europeias altas, em alguns lugares, o parâmetro europeu nunca vai responder todas as questões.”
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