No último mês, o Brasil testemunhou, mais uma vez, o descortinamento de fraudes no INSS. As informações tomaram os noticiários, com investigações conduzidas por órgãos de controle, como a Controladoria-Geral da União (CGU), que identificou, nas apurações iniciais, graves casos de descontos indevidos em benefícios previdenciários. Esses descontos estavam relacionados a contribuições feitas a associações e sindicatos sem autorização prévia dos(as) beneficiários(as) do INSS.
É importante esclarecer que as contribuições a entidades representativas, como associações e sindicatos, não são ilegais. O INSS firma Acordos de Cooperação Técnica com essas entidades, permitindo que aposentados(as) e pensionistas realizem, de forma voluntária, contribuições que visam garantir a defesa de seus direitos junto ao sistema previdenciário.
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Esses acordos estão regulamentados pelo art. 653 da Instrução Normativa 128, de 28 de março de 2022, que define normas internas do INSS e delimita os processos e parâmetros de sua organização. Contudo, para que os descontos sejam efetuados diretamente nos benefícios, é indispensável a autorização prévia e expressa dos(as) segurados(as).
Foi justamente nesse ponto que se concentraram as fraudes. Diversos(as) aposentados(as) e pensionistas identificaram descontos irregulares em seus benefícios e buscaram meios para impedir a continuidade dessas cobranças. Com o aumento das denúncias, os órgãos de controle iniciaram investigações e identificaram um número alarmante de fraudes, culminando na instauração de inquéritos e processos criminais contra os envolvidos.
Infelizmente, esse não é um episódio isolado. Fraudes contra o Regime Geral de Previdência Social (RGPS) são recorrentes. Contudo, o envelhecimento acelerado da população nas últimas décadas ampliou significativamente o número de aposentados(as) e, por consequência, o volume financeiro dos prejuízos.
Essas fraudes comprometem diretamente a sustentabilidade do sistema previdenciário, que é baseado na lógica de repartição: os(as) trabalhadores(as) da ativa contribuem para financiar os benefícios pagos aos que já se aposentaram.
Como não há limitação de idade ou tempo de recebimento do benefício, é comum que segurados(as) que contribuíram por períodos mínimos (15 anos ou 180 contribuições) acabem recebendo benefícios por décadas. Segundo dados da Secretaria do Tesouro Nacional e da Instituição Fiscal Independente (IFI) do Senado Federal, as despesas com o RGPS representaram, em abril de 2025, 8,2% do PIB
Esse desequilíbrio se agrava com a alteração da pirâmide etária brasileira. Na década de 1980, a base da população era muito mais larga que o topo. Quarenta anos depois, o número de idosos cresceu 57,4% em apenas 12 anos. Embora a maior parte da população ainda esteja na faixa economicamente ativa (15 a 64 anos), justamente a que mais contribui com o INSS, essa proporção tende a diminuir. Entre 1991 e 2022, a população entre 0 e 14 anos caiu de 34,7% para 19,8%, conforme dados do Censo 2022 do IBGE.
Nesse contexto, fraudes contra o RGPS afetam diretamente sua viabilidade futura, sendo indispensável a realização de avaliações atuariais periódicas para assegurar o pagamento dos benefícios àqueles que preencherem os requisitos legais.
Quanto às fraudes recentes, é necessário reconhecer que, embora ainda insuficientes, as medidas adotadas pelo governo e pelo INSS podem ter minimizado os impactos financeiros futuros, especialmente em razão da restituição voluntária de valores indevidamente descontados. Isso evitou a judicialização em massa, que poderia acarretar custos ainda maiores com juros (Selic), custas processuais e honorários advocatícios.
Ainda assim, é preocupante que a responsabilidade pela restituição tenha sido transferida às vítimas, ou seja, aos(as) beneficiários(as) com menor capacidade de identificar se foram lesados(as). Muitas dessas pessoas sequer têm acesso a informações suficientes para perceber os descontos indevidos.
É nesse cenário que o Judiciário deve atuar com firmeza, assegurando o ressarcimento integral dos valores subtraídos e promovendo uma investigação ampla, rigorosa e irrestrita para responsabilizar todos os envolvidos.
Além da atuação judicial, o Legislativo também tem papel crucial, especialmente com a proposta de instalação de uma CPI para aprofundar as investigações, reunir provas e propor medidas para evitar que essas fraudes se repitam. É urgente aumentar a transparência nos procedimentos internos do INSS, especialmente no que se refere à autorização de descontos em folha. O Poder Executivo e o próprio INSS devem criar mecanismos legais e tecnológicos de controle para evitar novas irregularidades.
O INSS tem responsabilidades claras como intermediário entre os credores (associações e sindicatos) e os devedores (beneficiários). Por isso, deve adotar todas as cautelas na análise e validação dos pedidos de desconto antes de proceder com os lançamentos automáticos nos benefícios.
Diante de todo esse cenário, é essencial que os(as) segurados(as) do INSS estejam atentos. Assim como já se tornou hábito conferir extratos bancários, faturas de celular ou cartão de crédito, é fundamental acompanhar, com frequência, os extratos dos benefícios previdenciários. Vale lembrar que as investigações só avançaram graças às inúmeras denúncias e à mobilização coletiva de aposentados(as) e pensionistas.
Mesmo com a eventual implementação de novas normas e mecanismos de controle, os(as) beneficiários(as) devem se manter vigilantes e buscar informações constantes, atuando como fiscais do próprio sistema. Afinal, o RGPS pertence a todos(as), e seu controle precisa ser mais eficiente e eficaz.
Por fim, é fundamental que os(as) segurados(as) economicamente ativos(as) se preparem com antecedência para a aposentadoria. Muitos relatam quedas drásticas na renda após se aposentarem, enfrentando dificuldades financeiras graves, inclusive com superendividamento e contratação excessiva de empréstimos consignados.
O envelhecimento saudável deve incluir, também, a saúde financeira. O planejamento previdenciário precisa começar desde o início da vida profissional. Para isso, é essencial que a educação financeira seja incorporada ao currículo escolar, preferencialmente a partir do ensino médio, para que as futuras gerações compreendam seus direitos, atuem como fiscalizadoras do sistema e saibam gerar renda e riqueza para o país.