O plenário do Senado Federal reconduziu Paulo Gonet ao posto de procurador-geral da República por mais dois anos pelo placar de 45 a 26 – ele precisava de pelo menos 41 votos. A votação ocorreu nesta quarta-feira (12/11). Gonet teve mais dificuldades na sua recondução – em 2023, ele recebeu 65 votos a favor e 11 contra, demonstrando o desgaste com o Congresso após a condenação do ex-presidente Jair Messias Bolsonaro.
Com essa votação, Gonet tornou-se o PGR com menor quantidade de votos no Senado para a aprovação desde a redemocratização, em 1988. Até então o marco pertencia a Aristides Junqueira, que, em 1989, contou com 47 votos favoráveis. Gonet foi indicado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
A jornalistas, o líder do governo no Senado, Randolfe Rodrigues (PT-SP) disse que o placar foi melhor do que o previsto por ele. Em seus cálculos, Gonet teria 43 votos. Alas mais otimistas, calculavam 50. “Isso é realidade [votação apertada]. É o diagnóstico da realidade da composição como é. É um diagnóstico de que tem a base, a base tem que estar sempre unida”, disse.
Gonet ficou seis horas sendo sabatinado na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado. Senadores do Partido Liberal (PL), do ex-presidente Jair Bolsonaro, deixaram claro a insatisfação com o PGR em relação a denúncia apresentada sobre a tentativa de golpe que levou à condenação de Bolsonaro, a alta cúpula militar e aliados. As condenações do 8 de janeiro também foram criticadas.
A oposição tomou o debate da sabatina perguntando sobre o impeachment de ministros e a anistia. Os senadores não viram com bons olhos o parecer de Gonet em uma ação no Supremo em que ele defendeu a legitimidade da PGR para apresentar denúncias de impeachment contra ministros da Corte, afastando a previsão da lei 1.079/50 que autoriza qualquer cidadão a provocar o Senado.
O senador da oposição, Rogério Marinho (PL-RN) disse durante a sabatina que “impeachment sem Senado é o fim da autocontenção entre os poderes”.
O senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) aproveitou a sabatina para criticar Gonet e protagonizou um desentendimento com o presidente da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado, Otto Alencar (PSD-BA), que pediu que ele respeitasse Gonet. “Se ele [Gonet] estivesse fazendo com o seu filho o que ele está fazendo com o meu pai, o senhor ia ver que eu estava sendo muito educado. Eu fui muito ponderado, muito sereno”, retrucou Flávio Bolsonaro.
Os senadores de oposição acusaram Gonet de alinhamento com os ministros do Supremo e disseram que ele teve uma postura omissa. “Quero lamentar sua recondução. O senhor aceitou passivamente o Ministério Público ser esculhambado. Não defendeu as prerrogativas constitucionais da instituição que deveria representar. Foi ignorado em vários momentos pelo ministro Alexandre de Moraes, que sequer consultava o Ministério Público para tomar alguma iniciativa. O senhor perseguiu e entrou no jogo sujo de uma pessoa que para mim é doente. Mas o senhor está lá e parece cumprindo ordens dele”, disse Flávio Bolsonaro.
O senador Jorge Seif (PL-SC) mencionou denúncias apresentadas pelo ex-assessor do Tribunal Superior Eleitoral Eduardo Tagliaferro, que acusou Alexandre de Moraes de ter cometido fraude processual quando presidente do TSE.
Gonet explicou que a Justiça Eleitoral exerce tanto funções administrativas quanto jurisdicionais. Portanto, no campo administrativo, é natural que haja troca de informações e recebimento de dados. “Não houve nada de impróprio nas relações da Procuradoria-Geral Eleitoral com a Presidência do TSE”, argumentou.
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O relator da indicação de Gonet, o senador Omar Aziz (PSD-AM) defendeu a recondução. “Uma das melhores posições de Gonet é que ele não é uma pessoa midiática. Ele trata as questões nos autos, e não pela imprensa, tentando ganhar um like a mais. O Judiciário brasileiro tem que se pautar pelos autos, e não se pautar pela opinião pública de um modo geral”.
Gonet também recebeu apoio de outros senadores durante a sabatina. O senador Eduardo Braga (MDB-AM) elogiou o trabalho do PGR. “O que estamos assistindo na CCJ é uma politização da posição da PGR. O lugar do PGR não é de ser de esquerda ou de direita, não é ser a favor de A ou B. É de cumprir a legislação brasileira”, disse. Braga também defendeu a ação penal contra os participantes do 8 de janeiro.
“Invadir e quebrar o Congresso Nacional, o STF e o Palácio do Planalto não pode ser algo banalizado. Seja pela esquerda, seja pela direita. Isso é uma questão de cumprimento da ordem, da lei e da Constituição. Não é questão ideológica ou partidária”.
Ponto a ponto da sabatina de Gonet
Inquérito das fake news (Inq 4781)
Gonet disse aos senadores que, embora o inquérito já dure 6 anos, ele não está parado, e a partir de informações dessas investigações foram feitas denúncias e arquivamentos. Como corre em sigilo, ele não poderia dar detalhes.
Anistia
O PGR disse que a competência para editar a anistia é do Congresso Nacional. Entretanto, Gonet ponderou que, do ponto de vista jurídico, há polêmica constitucional. Ele esclareceu que sua manifestação sobre o tema foi feita dentro de um processo e não houve qualquer tentativa de interferir em decisões do Legislativo. Gonet voltou a repetir que “as tintas da procuradoria não tem cores de bandeiras partidárias”.
“Eu não interfiro nas decisões que serão tomadas pelo Congresso Nacional. Nunca houve uma nota técnica do Procurador-Geral da República a respeito de um tema que seja objeto de debate no Congresso. Propositadamente, espero e não quero interferir na mais ampla liberdade de conformação da ordem jurídica que o Congresso dispõe dentro das balizas da Constituição”.
Penas de 8 de janeiro
Questionando sobre as rígidas penas impostas aos condenados pelo 8 de janeiro, Gonet disse que cabe ao Ministério Público denunciar de acordo com as leis postas e quem edita as leis é o Congresso Nacional. Assim, se houver entendimento no Legislativo sobre eventuais excessos, os ajustes devem ser feitos pelos congressistas.
Gonet aproveitou para lembrar que muitos réus foram condenados em penas restritivas de direitos, ou seja, com sanções alternativas à pena de prisão. Também lembrou dos 568 Acordos de Não Persecução Penal (ANPP).
“Em quase um terço dos casos, as penas foram inferiores e convertidas em restritivas de direitos. Em outro bom número de casos, houve acordo de não persecução penal. O Ministério Público denuncia fatos que o Congresso Nacional entendeu que devem ser punidos como crimes. Quem julga é o órgão do Judiciário”.
Impeachment de ministros
Questionado por senadores sobre o seu parecer em relação ao impeachment de ministros do Supremo Tribunal Federal, Gonet disse que “em nenhum momento” se mostrou contrário à possibilidade de afastamento. No entanto, em sua avaliação, o critério de impeachment de ministro deve ser diferente do critério de agentes políticos eleitos pelo povo.
No STF, Gonet defendeu que a legitimidade para apresentar denúncias de impeachment contra ministros da Corte cabe exclusivamente à Procuradoria-Geral da República, afastando a previsão da Lei 1.079/50 que autoriza qualquer cidadão a provocar o Senado.
Relação PGE e TSE
Questionado sobre eventual alinhamento com ministro Alexandre de Moraes, em especial nas denúncias feitas por Eduardo Tagliaferro de que haveria um conluio quando ele atuou como Procurador-Geral Eleitoral, Gonet disse que “há muito de malícia ou ignorância em torno desse episódio”.
Gonet explicou que a Justiça eleitoral exerce tanto funções administrativas quanto jurisdicionais. Portanto, no campo administrativo, é natural que haja troca de informações e recebimento de dados. “Não houve nada de impróprio nas relações da Procuradoria-Geral Eleitoral com a Presidência do TSE”.
O procurador disse que tem “admiração pela idoneidade, pela dedicação e pelo apuro técnico” dos ministros do Supremo e reforçou que atua “com total independência e respeito aos limites constitucionais”.
Apoio dos procuradores:
Questionado sobre monitoramento de procuradores, Gonet disse que a informação é “fake news”. Ele também leu uma nota de apoio à sua recondução de José Schettino, presidente da Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR). Após a leitura, disse: “parece que não há vergonha”.
Corrupção e Crime organizado
Ao ser questionado sobre a atuação da PGR em relação ao crime organizado, Gonet disse que o Brasil precisa combater as organizações criminosas e lembrou que essas organizações estão afetando o Estado Democrático de Direito (EDD), uma vez que impedem a atuação estatal. Também falou em defesa da dignidade da pessoa humana e da responsabilidade de agentes do estado.
Ao responder o senador Sérgio Moro (União-PR) sobre o pouco protagonismo do Grupo Nacional de Enfrentamento ao Crime Organizado (Gaeco Nacional) contra o crime organizado, Gonet respondeu que a exposição pode atrapalhar as investigações.
“As atividades do MPF não buscam mais a exposição midiática. O que nós queremos é que depois de apresentado o nosso trabalho e depois de solucionada, aí sim, recolher os louros da sociedade. Mas a exposição das atividades durante o seu curso podem não só ser contraproducentes em termos de continuidade dos trabalhos investigativos como também ela pode colocar em risco os direitos de imagem, privacidade, dos investigados, que ainda não foram condenados e têm presunção de inocência”
Em relação às investigações sobre o INSS, Gonet confirmou que há um inquérito em andamento e disse que qualquer arquivamento é provisório, podendo ser reaberto caso surjam novas provas.

