Lidar com as mudanças climáticas é um imenso e intrincado desafio para a humanidade, do nível global ao local, e embora não se trate de nenhuma novidade, pois já sentimos literalmente na pele os efeitos dessa mudança e há muito tempo já está posto que nosso modo de viver compromete nossa qualidade de vida, o avanço do tema no campo da gestão pública é muito lento e a implementação das ações necessárias é cercada de complexidade.
Além disso, quando um assunto passa a ser continuamente exposto sem uma abordagem adequada, sem um conteúdo de boa qualidade, ele acaba por se desgastar, as pessoas acabam se tornando refratárias a ele, e as iniciativas para colocá-lo em evidência podem gerar o efeito contrário ao desejado, que era o de tornar o tema mais conhecido e acessível.
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Há mais de uma década foi editada a lei que instituiu a Política Nacional sobre Mudança do Clima (Lei 12.187/2009) e a Lei Municipal 14.933/2009, que instituiu em São Paulo política com mesmo foco. Mais recentemente, foi elaborado o Plano de Ação Climática do Município de São Paulo, o PlanClima[1], um grande passo, por concentrar a discussão do tema, propor os direcionamentos necessários à atuação da administração e traçar objetivos e metas concretos.
Contudo, a implementação de política pública desse porte, que se conecta a todas as demais políticas e cujo sucesso depende de uma mudança cultural muito grande da sociedade, continua a ser um enorme desafio e para superá-lo existem ao menos dois fatores críticos de sucesso: o engajamento da sociedade em uma atuação coordenada com o Estado e o monitoramento da execução do plano, para verificar constantemente se objetivos e metas traçados estão sendo atingidos ou se há necessidade de ajustes.
Trazer a discussão sobre as mudanças climáticas para o cotidiano das pessoas através da disseminação de informações e conscientização sobre o problema é essencial para buscar o engajamento da sociedade. Os estudos na área de políticas públicas demonstram que para lidar com questões complexas, em cenários que são afetados por múltiplos fatores e especialmente quando presente alta vulnerabilidade social é fundamental envolver as pessoas afetadas na busca e implementação de soluções para o problema que estiver em foco.
Nas questões relacionadas à gestão de riscos e desastres, por exemplo, a integração da comunidade no processo traz contribuição importante não só para aprimorar o diagnóstico como também fortalece o processo participativo (Nogueira et al, 2022)[2].
Desta forma, para o sucesso do PlanClima é fundamental uma boa comunicação do governo, incluindo campanhas permanentes de conscientização pautadas pela lógica da comunicação clara, objetiva, concisa e simples, para efetivamente gerar conhecimento e mobilização.
O plano andou bem ao concentrar ações com esse foco nos equipamentos de educação devido à capilaridade destes, prevendo ações como inclusão do tema no currículo escolar, capacitação de professores e elaboração do programa municipal de educação ambiental.
Igualmente andou bem ao tentar desconstruir a ideia de que ações individuais de nada adiantam em face da dimensão do problema das mudanças climáticas, estimulando atitudes sustentáveis em quatro eixos: i) consumir de maneira diferente; ii) circular na cidade por outros modos; iii) adaptar-se para os impactos da mudança do clima; e, iv) informar-se e acompanhar as ações da cidade.
O monitoramento das políticas públicas, por sua vez, é imprescindível para a própria continuidade da política e seu aprimoramento, pois através dele é possível produzir/levantar dados e informações que irão balizar a tomada de decisões, construindo-se, assim, política pública de boa qualidade.
Um aspecto central que deve receber muita atenção nessa etapa é a construção de indicadores, sendo essencial, conforme a literatura (Jannuzzi, 2014)[3], conhecer a política ou programa em profundidade para poder construir bons indicadores. E exatamente neste ponto os relatórios sobre o PlanClima[4] ainda reconhecem falhas, apontando a necessidade de se definir indicadores adequados e criar política de produção e divulgação de dados, de observância obrigatória por servidores e órgãos, o que longe está de ser um problema, já que uma expectativa realista não é a de ausência de falhas, mas, sim, a de disposição da administração em corrigi-las.
É bom lembrar que a Câmara Municipal também tem o dever de acompanhar a execução do plano e, quando necessário, requisitar informações ao Executivo ou convocar secretários e responsáveis para esclarecimentos. Nesse contexto cabe registrar que tramita na Câmara projeto propondo a criação de uma Comissão Extraordinária de Enfrentamento da Crise Climática e Prevenção de Riscos (PR 23/25)[5], a qual pode contribuir, inclusive, para a sistematização das ações realizadas pelo parlamento, muitas vezes esparsas, tornando-as mais visíveis à população.
Outra medida comum no Legislativo é a realização de audiências públicas, ferramentas interessantes, pois além dos representantes do Poder Executivo que comparecem para trazer informações sobre o assunto em pauta, as audiências são destinadas à participação do público, que pode expor sua opinião e questionar as autoridades presentes, consistindo, portanto, em excelente oportunidade para promover o engajamento social.
Em síntese, os dois fatores de sucesso apontados neste texto estão bem retratados no Planclima, cabendo reiterar que para se atingir os objetivos do plano é imprescindível a atuação integrada e colaborativa entre as secretarias, sendo de todo desejável maior integração também entre Executivo e Legislativo, em uma perspectiva orientada para a harmonia e não apenas para a independência entre os Poderes.
[1] PlanClima SP – Secretaria Executiva de Mudanças Climáticas – Prefeitura
[2] NOGUEIRA, F.R. et al. O mapeamento de risco junto com atores locais. In: SULAIMAN, S. N. et al. Caminhos Participativos para gestão integrada de riscos e desastres: um projeto de pesquisa e extensão universitária. Santo André, SP: EdUFABC, 2022. p. 77-94. Disponível em: https://editora.ufabc.edu.br/downloads/download/5-livros-em-pdf/41-caminhos-participativos-para gestao-integrada-de-riscos-e-desastres.
[3] Jannuzzi, P. de M. (2014). Avaliação de programas sociais: conceitos e referenciais de quem a realiza. In: Estudos em Avaliação Educacional, v.25, n.58, maio/ago. 2014. Recuperado de: https://publicacoes.fcc.org.br/eae/issue/view/287/8 .
[4] PlanClima SP – Secretaria Executiva de Mudanças Climáticas – Prefeitura
[5] https://splegisconsulta.saopaulo.sp.leg.br/Pesquisa/DetailsDetalhado?COD_MTRA_LEGL=3&ANO_PCSS_CMSP=2025&COD_PCSS_CMSP=23