Em meio a um espaço político bastante limitado para medidas de elevação da carga tributária, o governo apresentou seu projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias para 2026 (PLDO 2026) contando com a necessidade de fazer um esforço de R$ 118 bilhões em medidas adicionais de arrecadação para conseguir cumprir a meta fiscal.
O chefe do centro de estudos tributários e aduaneiros da Receita Federal, Claudemir Malaquias, garantiu que esse processo será feito sem aumento de alíquotas de impostos e com algumas ações não especificadas para aumentar a resolução de litígios, melhorar ambiente de negócios e garantia de créditos tributários.
Com precatórios, déficit será de 0,1% em 2026
O governo projetou 18,8% do PIB em receita líquida, volume que, em um quadro de despesas de 18,9% do PIB, resultará em um déficit primário de R$ 16,9 bilhões, equivalente a 0,1% do PIB.
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Esse saldo negativo não significará o descumprimento da meta de superávit primário de 0,25% prevista na LDO porque há prerrogativa de abatimento de precatórios a serem pagos fora das regras fiscais, estimados em R$ 55,1 bilhões no ano eleitoral — para um total de R$ 116 bilhões em sentenças judiciais projetadas, mas cujo número final só deve ser efetivamente conhecido no próximo mês.
Alerta nas despesas discricionárias
Esvaziada de autoridades do mais alto escalão da área econômica, o que é incomum para uma apresentação de LDO, a proposta que vai subsidiar a elaboração do orçamento do ano eleitoral trouxe um cenário de longo prazo que acende uma série de alertas fiscais, mesmo que tenha algum toque de ficção em algumas projeções.
Os técnicos apresentaram um quadro no qual, a partir de 2027, as despesas discricionárias, aquelas de livre uso do governo, vão sendo dizimadas. Elas passam de R$ 208,3 bilhões em 2026 para pouco mais da metade disso no primeiro ano do próximo governo, caindo bem mais no ano seguinte (já descumprindo o piso de investimentos previsto no arcabouço) e chegando virtualmente a zero em 2029, último período projetado pela equipe econômica.
Governo piora o próprio cenário de médio prazo
O cenário destoa do projetado há um ano pelo próprio governo. No PLDO de 2025, a equipe enxergava queda nas discricionárias em 2027 para R$ 168 bilhões e R$ 151 bilhões em 2028, algo difícil de lidar, mas bem menos problemático do que o quadro pintado na peça apresentada hoje.
Parte do problema foi atribuída aos precatórios, que daqui a dois anos não poderão mais ser deduzidos das regras fiscais. Outra parte é responsabilidade da trajetória de metas de resultado primário indicadas na peça enviada hoje ao Congresso, que o governo prevê chegar a 1,25% em 2029, com objetivos mais ousados já a partir de 2028.
Como no cenário de receitas de médio e longo prazo o governo não contemplou arrecadação extra, como está fazendo para 2026, a consequência, segundo a explicação do secretário de orçamento, Clayton Montes, foi a forte contração de gastos livres do governo e até mesmo um recuo na despesa primária geral.
Outro aspecto questionável dos dados apresentados no PLDO 2026 é que as projeções não contemplam o acionamento de gatilhos decorrentes da redução nominal das discricionárias, algo previsto no arcabouço fiscal.
Assim, o governo, que vendeu no ano passado um orçamento de médio prazo como uma grande evolução na gestão fiscal, acaba por desvalorizar o instrumento ao apresentar um cenário nada factível, uma vez que considera metas irrealistas e a não aplicação das próprias regras do arcabouço.
Também não parece factível trabalhar com uma inação no lado das receitas a partir de 2027, prevendo uma queda de praticamente 1 ponto porcentual do PIB na arrecadação administrada pela Receita Federal entre 2026 e 2029. A queda da carga tributária é uma hipótese heroica, mesmo que seja eleito um presidente alinhado com o liberalismo.
Haverá revisão de despesas?
Do ponto de vista político, ficou claro que o objetivo da equipe econômica foi mostrar um cenário no qual será necessário fazer revisões relevantes do lado da despesa nos próximos anos, algo enfatizado pelos técnicos presentes à coletiva.
Mas o próprio anexo de revisão de gastos, outra inovação introduzida no ano passado que dessa vez ficou de fora da apresentação, mostra o quão difícil é a tese do ajuste desse lado da equação. O dispositivo prevê apenas três medidas de ajuste, nas quais o governo prevê uma economia média anual da ordem de R$ 10 bilhões nos gastos.
É um volume muito aquém do necessário para viabilizar um orçamento que sirva para estabilizar a dívida pública, de um lado, e que permita ao setor público não só pagar benefícios sociais e servidores, mas também realizar investimentos, que desaparecem a partir de 2028 nos dados projetados.
Faltou refinamento e mais realismo nas projeções do PLDO 2026. Mesmo assim, ela ajuda a entender melhor os “nós” de longo prazo e as dificuldades na construção de um orçamento que consiga dar conta das múltiplas necessidades da economia brasileira.