O diretor de Política Econômica do Banco Central (BC) Diogo Guillen disse que nunca teve “dúvida da eficácia da política monetária” e afirmou que eventuais gargalos na transmissão dos juros, que são conhecidos como “canais entupidos”, são fruto de características estruturais. O diretor falou nesta sexta-feira (8/8) durante o Fórum JOTA, realizado em São Paulo, com patrocínio da Amazon e da Confederação Nacional das Indústrias (CNI), com apoio do Jusbrasil.
Segundo Guillen, o patamar atual da Selic, de 15% ao ano, vem produzindo os efeitos esperados sobre o nível de atividade e sobre a inflação. “Nunca tive dúvida sobre a eficácia da política monetária. É o tema sobe o qual mais falo nas minhas apresentações: a política monetária funciona. E sigo convicto disso”.
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O diretor explicou que a estratégia adotada pelo Copom, de interromper o ciclo de alta e manter a Selic em patamar “significativamente contracionista” por um período prolongado, busca assegurar a convergência da inflação para a meta. Essa postura é reforçada pela ata da última reunião, divulgada na semana passada, que ressalta a importância de preservar cautela em um ambiente externo mais incerto, marcado por tensões geopolíticas e mudanças na política comercial e fiscal dos Estados Unidos.
Os “canais entupidos”, isto é, a percepção de que a política monetária nem sempre se transmite de forma uniforme por todos os setores da economia, são fruto, no caso brasileiro, de fatores como o alto grau de indexação de preços, a relevância do crédito direcionado e a baixa competição em alguns segmentos do sistema financeiro, segundo Guillen. Esses elementos, diz o diretor, são estruturais e, portanto, não podem ser resolvidos apenas com ajustes de curto prazo na taxa Selic.
Inflação
Mesmo com algumas surpresas baixistas no IPCA nos últimos meses, a inflação e alguns de seus núcleos permanecem acima dos níveis compatíveis com o cumprimento da meta. Guillen apontou que o comportamento dos preços de serviços é mais preocupante, pois o segmento tem maior inércia e está diretamente ligado ao aquecimento do mercado de trabalho.
Na ata divulgada na semana passada, o BC também observa que, apesar da desaceleração de bens industrializados e alimentos, a inflação corrente segue pressionada por fatores de demanda. Para o Copom, essa é mais uma evidência de que a política monetária precisa ser mantida em patamar restritivo até que haja reancoragem das expectativas e redução consistente do hiato do produto.
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Guillen afirma que a convergência da inflação à meta depende não apenas de fatores domésticos, mas também do cenário externo, que hoje é mais incerto e adverso. Tensões comerciais que se intensificaram no último mês, especialmente com os Estados Unidos, com o tarifaço direcionado ao Brasil pelo governo Donald Trump, que podem afetar o câmbio e, por consequência, a inflação.
Segundo o diretor, as decisões de juros seguem baseadas em um conjunto de indicadores e não em respostas pontuais a dados específicos. “O compromisso é seguir vigilante, com uma taxa apropriada por período prolongado. Os passos futuros podem se ajustar”, disse.
Modelagem e expectativas
Guillen disse que uma das divergências entre as projeções do mercado e da autoridade monetária está na leitura sobre o hiato do produto, medida que compara o nível de atividade econômica com seu potencial. “Todos concordamos que o hiato está positivo, mas há divergência sobre como ele vai evoluir nos próximos seis ou oito meses”, afirma.
De acordo com o diretor, muitos agentes do mercado incorporam em suas projeções estímulos fiscais ainda não anunciados, o que leva a estimativas mais altas de crescimento e inflação. O BC, por outro lado, mantém suas projeções baseadas em medidas já implementadas ou formalmente divulgadas, buscando evitar incorporar hipóteses especulativas. Essa diferença de abordagem ajuda a explicar por que as projeções do Boletim Focus para a inflação (5,1% em 2025 e 4,4% em 2026) permanecem acima das estimativas do BC.
No BC, expectativas de inflação, hiato do produto, projeções e inflação corrente são avaliadas em conjunto, sem atribuir peso maior a um único fator. Para Guillen, mesmo que o modelo aponte inflação na meta, expectativas persistentemente acima dela exigem atenção, pois elevam o custo de desinflação e podem forçar a manutenção de juros altos por mais tempo.
Fórum JOTA
O encontro, que contou com a abertura de Diogo Guillen, segue com nomes como Guilherme Mello, secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda, Gustavo Guimarães, secretário executivo do Ministério do Planejamento, e Gleisi Hoffmann, ministra da Secretaria de Relações Institucionais do Governo. O objetivo é discutir a conjuntura e o futuro do Brasil com lideranças, e promover diálogo entre os setores público e privado.
Na abertura, Felipe Moreno, CEO do Jusbrasil Soluções, disse que há um encontro de valores entre JOTA e a empresa: “Promover o acesso à justiça, à segurança jurídica, e o acesso à informação qualificada é indispensável para o futuro do país”.
Depois Alexandre Vitorino, diretor jurídico da Confederação Nacional da Indústria (CNI), um dos patrocinadores do Fórum, também teve a palavra. Para ele, uma das prioridades de diálogo para maior segurança jurídica nas áreas econômicas é o mercado de trabalho, com foco nas novas modalidades de trabalho. “As novas formas de trabalho não são formas de exploração, mas formas de diversificação”, disse. “O Brasil vem se adaptando a essa realidade, mas precisamos avançar”.