A reabertura dos trabalhos legislativos é uma oportunidade estratégica para retomar debates que ficaram represados nos últimos anos, e a valorização das carreiras de Estado, especialmente da magistratura e do Ministério Público, deve figurar entre as prioridades.
Nesse contexto, a chamada PEC do Quinquênio (PEC 10/2023) representa mais do que um mero ajuste remuneratório. Ela aponta para a necessidade de um novo pacto que una transparência, previsibilidade e reconhecimento da experiência funcional.
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O ano de 2025 marca dez anos desde a entrada em vigor da Lei 11.143/2005, que regulamentou o regime de subsídios para magistrados e membros do Ministério Público. Passados esses dez anos, é possível fazer um balanço honesto de seus efeitos. Embora tenha sido importante para trazer simplicidade e transparência à estrutura remuneratória, o modelo mostrou-se vulnerável à estagnação inflacionária e à ausência de mecanismos de progressão funcional. O tempo expôs as lacunas de um sistema que, se não for aperfeiçoado, se esvazia.
Nesse sentido, a PEC 10/2023 surgiu como uma correção de rota que leva em conta o aprendizado institucional acumulado na última década. Desde sua origem, o regime de subsídios buscava corrigir distorções causadas pela multiplicidade de rubricas remuneratórias, unificando vencimentos em uma única parcela mensal. A ideia era nobre, ou seja, conferir simplicidade e clareza aos contracheques, evitando abusos e aumentando a compreensão da sociedade sobre os rendimentos das carreiras jurídicas.
No entanto, essa construção ficou incompleta. A Constituição Federal, em seu art. 37, inciso X, prevê a revisão geral anual da remuneração, mas essa previsão raramente foi efetivada. O congelamento, ou os reajustes abaixo da inflação, produziu uma corrosão progressiva dos subsídios, sem qualquer mecanismo institucionalizado de compensação. O resultado é que, na prática, o regime de subsídios perdeu sua eficácia, e voltaram a surgir parcelas acessórias, sob diferentes nomenclaturas e fundamentos, muitas vezes com pouca transparência ou clareza jurídica.
Ainda mais grave é o fato de que o modelo atual também desconsidera o tempo de serviço e a experiência funcional. Desde a supressão dos quinquênios, em 2006, não há qualquer valorização objetiva da trajetória institucional dos magistrados e membros do MP. Isso cria distorções, como situações em que profissionais recém-ingressos percebem o mesmo que colegas com décadas de atuação, sem que haja diferenciação com base em mérito, antiguidade ou contribuição acumulada.
A PEC 10/2023 busca enfrentar esse problema de forma estruturada e transparente, ao prever a criação de uma parcela de valorização por tempo de exercício. O mecanismo proposto não é uma bonificação arbitrária, tampouco se confunde com os “supersalários” que tanto preocupam a opinião pública. Trata-se, isso sim, de um instrumento racional de progressão, compatível com o que já se observa em outras carreiras públicas, como na Advocacia Pública, no magistério e mesmo em planos de cargos e salários de servidores administrativos.
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Mais do que isso, a PEC 10/2023 pode funcionar como indutora de uma nova etapa institucional, que resgate os princípios originais do regime de subsídios, reforce a separação entre parcelas remuneratórias e indenizatórias, e reintroduza critérios objetivos e impessoais de valorização funcional. É um debate legítimo, necessário e que deve ser enfrentado com honestidade intelectual.
A retomada de um regime genuíno de subsídios – com distinção clara entre parcelas remuneratórias e indenizatórias, estas restritas às de natureza estritamente ressarcitória –, a manutenção do valor real dos subsídios, por meio de revisão anual, e a adoção de mecanismo de valorização do tempo de serviço, através da aprovação da PEC 10/2023, constituem pré-requisitos para um sistema remuneratório que faça justiça aos integrantes das carreiras da magistratura e do Ministério Público e que também confira a transparência necessária ao escrutínio da sociedade.