Descendente de militares e ferrenha opositora à legalização do aborto, vice se desentendeu com presidente e foi alvo de duras críticas da Casa Rosada Internacional, Argentina, Javier Milei, milei, Victoria Villarruel CNN Brasil
Escolhida por Javier Milei para ser sua número dois na chapa eleitoral, a argentina Victoria Villarruel esteve sob os holofotes nas últimas semanas por ter se tornado alvo de críticas de integrantes do governo argentino e do próprio presidente, que referiu-se a ela em um discurso como “ignorante traidora”.
Rosto importante na corrida eleitoral para a captação do eleitorado conservador, Villarruel passou a ser mal vista entre os seguidores de Milei após uma sessão legislativa resultar no aumento das aposentadorias da Argentina.
A Casa Rosada defendia que a vice – que também cumpre o papel de presidente do Senado – não permitisse a realização da sessão. Para o gabinete de Milei, os aumentos aprovados pelo Senado atentam contra a política de superávit fiscal defendida a ferro e fogo pela atual administração.
A vice argentina, no entanto, disse estar cumprindo sua função institucional ao presidir a sessão.
Duramente repreendida pelos libertários, a vice decidiu expor o racha com Milei, queixando-se que o presidente não fala com ela, defendendo que se há equilíbrio fiscal, o aumento das aposentadorias e de benefícios para pessoas com deficiência – cujo aumento também foi aprovado – não deveria ser um problema.
Ela disse que se o objetivo for economizar, isso deveria ser feito com cortes em viagens e em gastos com o Serviço de Inteligência estatal.
Quem é a vice de Milei
Nascida em 1975, em Buenos Aires, Victoria Villarruel vem de uma família de militares e foi justamente a defesa dos uniformados que a projetou na política argentina.
O pai da vice, Eduardo Marcelo Villarruel, já falecido, foi veterano da Guerra das Malvinas – conflito armado promovido pela ditadura argentina em 1982 contra o Reino Unido na tentativa de recuperar o território das ilhas reivindicadas pela Argentina) – e integrante dos “Carapintadas”, grupo que promoveu levantes militares após o retorno à democracia, contra os julgamentos por violações aos direitos humanos durante a ditadura.
Mas a linha sucessória militar data de antes: Villarruel é neta de Laurio Hedelvio Destéfani, também falecido contra-almirante, que se desempenhou como historiador naval.
Em 2006, Villarruel foi uma das fundadoras de uma associação civil denominada Centro de Estudos Legais sobre o Terrorismo e suas Vítimas, para dar visibilidade às vítimas de atentados promovidos por guerrilheiros do Exército Revolucionário do Povo (ERP) e dos Montoneros.
O grupo pede o julgamento dos guerrilheiros e o reconhecimento de vítimas das ações armadas promovidas por grupos de esquerda, diz que na Argentina “os direitos humanos são seletivos” e afirma que houve uma “guerra” entre guerrilheiros e o Estado.
Em uma entrevista, ela contou que, em 1973, seu próprio pai foi feito refém em um hospital militar por guerrilheiros do ERP, com mãos e pés amarrados com arame e uma pistola apontada para sua cabeça.
Para a vice, o número de 30 mil mortos e desaparecidos pela ditadura argentina calculado pelas organizações de direitos humanos é uma “mitologia”, e que a cifra correta é 8.751 vítimas. As afirmações, repetidas por Milei em campanha, levaram a protestos de organizações de direitos humanos, que alegaram negacionismo dos crimes da ditadura.
Quando já era candidata a vice, em 2023, Villarruel negou durante uma entrevista ao canal de notícias La Nación + que visitava frequentemente os “genocidas” – agentes da repressão julgados na Argentina por crimes contra a humanidade, como o falecido ditador Jorge Rafael Videla.
“Não, não é verdade (…) Vi o Videla no máximo duas, três vezes, talvez”, garantiu, afirmando que as visitas foram para entrevistá-lo sobre a década de 1970 para um livro que escrevia. “Claro que não estou de acordo com os desaparecimentos [promovidos pela ditadura], mas tenho que perguntar se quero escrever sobre essa época”, afirmou.
Conflito com Milei
Católica, fez campanha contra a legalização do aborto aprovada pelo Legislativo da Argentina em 2020, antes de ser eleita deputada pela cidade de Buenos Aires em 2021 pelo partido de Milei, A Liberdade Avança.
Dois anos depois, foi escolhida por Milei para integrar a chapa presidencial, aparecendo em entrevistas ao lado do candidato libertário.
A fratura entre ambos, porém, parece ser irreparável: nos últimos dias, Villarruel questionou publicamente por que o presidente não escolheu sua irmã, Karina Milei – secretária geral da Casa Rosada, que faz as vezes de primeira-dama – para o cargo, enquanto o Executivo argentino afirmou que a vice já não faz parte do governo.